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20 de janeiro de 2011

Cavaco Silva: perguntas sem respostas 

por Ana Gomes

O candidato Cavaco Silva tem vindo a queixar-se de "baixeza" e "vileza" por questões levantadas sobre o seu desempenho como Presidente da República e sobre decisões que tomou antes, como cidadão.
Ora, uma campanha eleitoral democrática constitui justamente oportunidade para se questionar o comportamento, as ideias ou o carácter dos candidatos. E estando em causa eleger o Presidente da República, é desejável que os candidatos agarrem todas as oportunidades para esclarecer os eleitores. Se alguém não quer a sua actuação escrutinada, não deve candidatar-se a cargos públicos. Pois em democracia não há questões sobre a vida pública "sujas", nem temas "intocáveis", nem candidatos acima da lei e do dever de clarificar.
O argumento do Prof. Cavaco Silva de que "é preciso nascer duas vezes para ser mais honesto" do que ele, e assim evitar responder a perguntas, não é democraticamente aceitável. Além de insuportável arrogância, visa inibir o direito de questionar por parte dos cidadãos que têm perguntas legítimas a fazer ao ainda Presidente da República e ao candidato que almeja continuar nessa mais alta magistratura da Nação.
Igualmente inaceitável é que o Prof. Cavaco Silva tenha faltado a uma entrevista que a sua campanha tinha combinado para o dia 17, nesta última semana eleitoral, à jornalista Maria Flor Pedroso na ANTENA UM, a Rádio pública nacional. Fê-lo sem justificação de força maior e sem disponibilidade para aprazar outra hora ou dia: pura e simplesmente recusou-se a responder a perguntas, a dar a cara para esclarecer os cidadãos.
Assim o Prof. Cavaco Silva deixou por explicar questões legítimas e pertinentes, que ninguém pode considerar ofensivas, pois não respeitam ao foro estritamente privado, antes têm claras implicações para os interesses nacionais e para o bolso dos contribuintes portugueses.
Abaixo enuncio algumas que tenho o direito de ver respondidas e que vão continuar a ser colocadas ao Prof. Cavaco Silva:

1. Sobre a inventona das escutas (a suspeita confiada à imprensa de que o Governo estaria a "espiar" o Presidente por escutas telefónicas e vigilância informática):
- Afinal, de quem foi a iniciativa de revelar suspeitas presidenciais ao jornal "Público"? Do assessor Fernando Lima? Ou agiu ele por instruções do Presidente Cavaco Silva? Se a responsabilidade foi do assessor, porque foi ele mantido na Casa Civil do Presidente da República, depois de tão grave conspiração? Estamos a falar, sem dúvida, de um dos actos mais atentatórios do regular funcionamento das instituições democráticas praticados desde 1974: uma intrigalhada destinada a envenenar relações entre Presidente e Governo e a atribuir ao Governo uma actuação criminosa sem o menor fundamento.

2. Sobre as acções que deteve na SLN:
Como é que o Presidente/candidato Cavaco Silva pode apresentar-se, na entrevista que deu a Judite de Sousa, no dia passado dia 10 de Janeiro na RTP, como apenas um "mísero professor" a aplicar as suas poupanças em 2001, quando ordenou a compra de acções da SLN, a sociedade dona a 100% do BPN? Ora, não era já então, em 2001, o cidadão Cavaco Silva um ex-Ministro das Finanças e um ex-Primeiro Ministro deste país?
E não devia então já compreender, como bem explicou o Presidente Ramalho Eanes há dias, as razões por que bancos e sociedades correm atrás de ex-governantes e ex-presidentes para, mais do que captar as suas poupanças, lhes capturarem nomes e prestigio para credibilizarem as suas actividades empresariais? Então como se prestou o ex-governante Cavaco Silva, para mais avisado economista, a adquirir acções da SLN logo no ano de 2001, em que o Banco de Portugal começava a questionar as práticas do controlado BPN (e por isso Dias Loureiro lá foi então tentar dissuadir o Dr. António Marta...) e no mesmo ano em que, logo em Março, a revista EXAME publicava uma investigação denunciando a metodologia BPN (logo, da sua dona SLN)? E, se acaso comprou inadvertidamente essas acções antes de Março de 2001, porque as manteve até 2003, com tantos sobrolhos já levantados então sobre os negócios BPN/SLN?

3. Sobre a casa na Aldeia da Coelha, já conhecida também por "aldeamento BPN/SLN" - como é que o candidato Cavaco Silva se permite afastar as perguntas legítimas da revista VISÃO argumentando não saber onde e quando fez a escritura da casa que possui neste empreendimento? Como não sabe? Como não encontra meios de saber e esclarecer a opinião pública? Para mais um auto-proclamado "rigoroso" economista que aspira a continuar Presidente da República? .

4. Sobre o escândalo BPN - porque manteve até ao limite Dias Loureiro como seu Conselheiro de Estado, porque não se demarcou dele publicamente, mal foram conhecidas as negociatas lesivas que conduziu como administrador do BPN/SLN? Porque nunca falou nem exigiu esclarecimento sobre o esquema de corrupção instalado no BPN/SLN? E por que razão homologou a nacionalização dos prejuízos do BPN em 2008, sem exigir também a nacionalização dos activos da SLN, deste modo fazendo recair sobre os contribuintes portugueses hoje os encargos deste ruinoso negócio?

5. Sobre a falta de Europa para responder à crise - porque se absteve até hoje de intervir junto da sua família política da direita europeia, onde pontificam a Chanceler Merkel e o Presidente Sarkozy, em favor de soluções para flexibilizar e reforçar o Fundo Europeu de Estabilização Financeira e para criar Obrigações de Tesouro europeias, conforme proposto pelo Parlamento Europeu, pelo Primeiro Ministro Juncker, pelo Ministro das Finanças Tremonti, até pelo Presidente da Comissão Europeia...? Porque não pôs o seu capital político, como Presidente e ex- PM, a render em favor das soluções europeias para a crise que tardam e prefere continuar a proteger os mercados dos "insultos"?

Porque não responde o Prof. Cavaco Silva? Porque tem medo destas perguntas legítimas?
E, não querendo responder, como podemos nós, portugueses, continuar a confiar-lhe a Presidência da República?


publicado hoje no JORNAL DE LEIRIA

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