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26 de maio de 2015

Os desafios da justiça timorense - o caso Tiago Guerra/Fong Fong 

Por Ana Gomes

Falo-vos hoje de Dili, Timor Leste, onde já não vinha há dois anos. 

Dois anos que fazem muita diferença num País que celebrou há dias o décimo terceiro aniversario da independência, depois de 24 de dura ocupação, o ultimo de destruição avassaladora. É incrível o que Timor Leste se reconstruiu e progrediu, sobretudo depois da crise política de 2006/7. 

Hoje a electricidade chega aos distritos, há estradas rasgadas, pontes, prédios e casas em construção por todo o lado, há passeios e jardins a ser arranjados na cidade, há restaurantes, cafés, lojas e motéis em profusão,  há semáforos a funcionar para disciplinar o tráfico intenso, há ruas iluminadas e até praças engalanadas com luzes azuis escaganifobéticas... Enfim, um país que gradualmente ganha capacidades e investe em infra-estruturas e na educação os rendimentos do petróleo, que tem gerido e procurado proteger num Fundo para Gerações Futuras, que hoje já amealha  16 mil milhões de dólares. Mas, que os timorenses sabem, não durará sempre.

Para mim o melhor de Dili continua a ser o mar, uns dias revolto, outros espelhado, com a ilha Ataúro ao fundo, de um lado, e as altas montanhas atapetadas de verde do outro. E a melhor hora o fim da tarde, a luz do por do sol entrecortada por milhares de crianças saltitantes a regressar a casa, nos seus coloridos uniformes escolares.

Isto Dili. Do resto não posso falar, três dias não dão para sair da capital. Esta foi uma visita-relâmpago espartilhada pela agenda no Parlamento Europeu. 

Mas era preciso vir para conversar com velhos amigos e tentar entender o que se passa com a Justiça em Timor Leste. Todos estamos bem lembrados do tristíssimo  episódio da expulsão de magistrados portugueses há uns meses. Talvez por isso, houve menos atenção sobre a prisão de doiscidadãos  portugueses em Dili pela mesma altura. O que me foi chegando sobre o caso era estranho, confuso, perturbante. 

Vim assim,  voltei a vir, por causa de gente na prisão. Não como  da primeira vez, em Marco de 1999, quando todo o território era uma prisão para o povo timorense. 

Desta vez os presos são portugueses, o engenheiro informático Tiago Guerra e a sua mulher macaense, Fong Fong, ele na cadeia de Becora há sete meses, ela sujeita a termo de identidade e residencia. Por suspeitas de envolvimento num caso de branqueamento de capitais protagonizado por um seu vizinho, o americano-nigeriano Bobby Boye, contratado pela cooperação norueguesa para ajudar Timor a negociar os contratos de petróleo, que enganou tudo e todos no governo timorense, desviando milhões em proveito próprio.

O que me inquietava sobre os dois portugueses, além de tristes peripécias na momento sua detenção, era o teor dos autos de detenção e de decisões posteriores que mantiveram a prisão preventiva - li tudo atentamente. Bem sei que a lei processual timorense se inspira na nossa e ambas cometem o erro - que se volta contra a própria Justiça - de prender primeiro, para investigar depois - e o depois pode estender-se por um ano e meio atrás de grades. Inquietava-me também, e muito, o Estado de saúde de ambos, a ter já exigido súbitos internamentos hospitalares. 

Não me passava, nem me passa pela cabeça, que as autoridades judiciais timorenses não tenham de prosseguir o seu trabalho de investigação com independência, ainda por cima sendo tão crucial para a consolidação de instituções democráticas o combate contra a corrupção. Mas quis pedir compreensão  humanitária para com o sofrimento de uma jovem familia, hoje com pais e filhos pequenos separados, para poder aguardar com medida de coacção menos traumatizante o fim da investigação, de eventual acusação e de julgamento.

Nos contactos que fiz com as mais altas autoridades timorenses,  julgo ter encontrado compreensão. Com muita pena minha, porém, não consegui falar com o Senhor Procurador Geral da Republica, apesar de porfiadas tentativas. 

Enfim, espero que a investigação avance rapidamente, agora que o escroque Bobby Boye  já se deu por culpado nos EUA e forneceu no mês passado detalhes sobre cúmplices e como operou o golpe de transferir determinadas quantias do Fundo de Petróleo de Timor para uma sua empresa fictícia, sem qualquer  relação com outra transferência bancária que levantou suspeitas sobre os vizinhos portugueses.

Bem sei que as autoridades judiciais timorenses tentaram impedir a expulsão dos magistrados portugueses, certamente por sentirem que ainda necessitavam do seu apoio e por afirmação da sua própria independência face aos poderes executivo e legislativo. Bem sei que confrontada com o embuste "Bobby Boye" deslindado pelos EUA, mais desafiada se sente a justiça timorense a dizer de sua justiça. Mas a capacidade conta e muito: trágico e prejudicial para a imagem de Timor Leste seria tentar fazer justiça prolongando uma injustiça.

(Transcrição da minha crónica desta manhã no Conselho Superior, ANTENA 1)

19 de maio de 2015

Governo festeja saída da troika, mas a troika não saiu dele... 

Por Ana Gomes

 

 

A coligação no Governo festejou há dias em Guimarães a saída da troika. A troika pode ter saído de Portugal, mas não saiu deste Governo e das políticas desastrosas que ele impõe ao país.

 

O mesmo Pedro Passos Coelho que enganou os portugueses com falsas promessas para chegar ao poder, e depois de lá chegado aplicou um programa mais troikista do que a troika, agora que se aproximam as eleições (apesar de em 2012 ter deixado escapar que se estava lixando para as eleições, na realidade não está!), volta a esmerar-se no embuste e manipulação. Agora transforma números medíocres em números auspiciosos!

 

É o que acontece com os dados do INE referentes ao primeiro trimestre de 2015. Todos os resultados estão abaixo das previsões - de todos os analistas: Comissão Europeia, Universidade Católica, gabinetes de prospectiva dos bancos, etc.

 

A Comissão Europeia previa um crescimento em cadeia de 0,5. O INE  apresenta O,4. 

A Comissão previa um crescimento homólogo de 1,7. O INE apresenta 1,4.

A Católica previa 0,9 em cadeia. O INE apresenta 0,4. 

A Católica previa de crescimento homólogo 2,1. O INE apresenta 1,4.

 

A menos que o Primeiro-Ministro queira voltar a pôr em causa o INE - como fez há semanas - o crescimento do primeiro trimestre de 2015 é inferior às previsões de todas as instituições. O resultado em cadeia (0,4) é apenas igual ao trimestre anterior. A taxa de crescimento não subiu - estagnou. Esta é a realidade. Ou seja, o Governo enche a comunicação social de parangonas sobre um crescimento económico que não existe.

 

No jantar festejante em Guimarães, há dias, o Primeiro Ministro entregou-se a mais truques de malabarismo: voltando a prometer um défice inferior a 3 por cento do PIB para este ano, acrescentou que será proeza sem precedentes: a primeira vez desde que existe Democracia e Moeda Única! Quer dar-nos por parvos ou desmemoriados: como se os Primeiros Ministros Guterres, Durão Barroso e Sócrates não tivessem, todos eles, conseguido deficits abaixo dos 3 por cento e saído de procedimentos por défice excessivo...., pela ultima vez em 2007, no ano imediatamente anterior ao estalar da crise financeira internacional, que o Governo persiste em ignorar.

 

O Governo anuncia amanhãs que cantam, apesar do IEFP contabilizar 713 mil desempregados, dos quais 350 mil jovens desocupados, ou seja, que não estudam, nem têm emprego. Fora os já fora das estatisticas e os estagiários, os precários e os 300.000 emigrados. Para vergonha das nossas caras, temos hoje 2,5 milhões de pobres, segundo a Caritas, e uma em cada três crianças a viver abaixo do limiar de pobreza!

 

E temos, pela mão deste Governo, o maior aumento de impostos de sempre, que se mantem sobre quem paga impostos. Enquanto grandes devedores ao fisco continuam alegremente a fugir para paraísos fiscais ou a ser escandalosamente beneficiados! Como o Novo Banco que viu o Governo perdoar-lhe 85 milhões...

 

Estes são os factos acabrunhantes do caminho para o "Milagre Económico" de que o Ministro da Economia falava há uns tempos, mas que ninguém vê. O que os portugueses estão a ver é o elevado desemprego estagnado, a emigração a continuar a roubar ao país milhares de jovens e quadros técnicos qualificados. E a economia sem arrancar.

 

O investimento previsto continua a mostrar-se insuficiente para, por si só, criar emprego. E o Governo, que acredita em milagres, tem sido incapaz de compensar esse défice com investimento público. O célebre banco de fomento, com que há anos o Governo acena e que  recebeu luz verde da Comissão Europeia há mais de dois anos, continua parado. Às empresas, às instituições, às autarquias, não chegou um cêntimo de fundos europeus que o dito banco de fomento desde o inicio de 2014 devia estar a canalizar. Isto é dramático! Há milhares de PMEs que não conseguem obter crédito na banca comercial - depois da revisão das rácios de cobertura dos bancos, há agora exigência de maiores garantias.

 

Apesar de ter os cofres cheios, segundo a Ministra das Finanças, o Governo continua a recusar fomentar investimento público - via que é indispensável ao crescimento e à criação de emprego. E Não obstante estar a beneficiar de três brindes excepcionais: a intervenção do BCE nos mercados, há dois anos e reforçada este ano, e a baixa simultanea e substancial de dois indicadores fundamentais - os preços do petróleo e do dólar.

 

Mas há dias em que mesmo a um compulsivo mistificador, como Passos Coelho, lhe foge a boca para a verdade:  ele gabou-se publicamente de como nos tinha feito engolir, sem querer saber de dores e efeitos secundários, o remédio amargo e abrasivo que  aviou junto da troika. Havemos bem de o  lembrar no dia de ir votar nas próximas eleições: é que não nos poderemos queixar da mistela, se continuarmos a deixar tal curandeiro tratar da saúde do país, como aquele inglês que tratou da saúde ao seu cavalo...

 


(Transcrição da minha crónica desta manhã no Conselho Superior, ANTENA 1)

 

 

16 de maio de 2015

Revisitar a TSU 

TSU revisitada

[Diario Económico, 11/5/2015]

1. Em jeito de promessa eleitoral, Passos Coelho anunciou a intenção de voltar a propor na próxima legislatura a redução da contribuição das empresas para a segurança social (TSU), como incentivo ao emprego e ao investimento.

Desta vez, ao contrário da proposta abortada de 2012, maciçamente rejeitada nas ruas, a descida da TSU do lado das empresas não seria compensada por um aumento do lado dos trabalhadores, ficando por explicar como seria coberta a perda de receita da segurança social. Ora, uma redução significativa da TSU empresarial (atualmente 23,75% da massa salarial) traduz-se num rombo descomunal nas finanças da segurança social.

Excluída qualquer redução adicional das prestações sociais e pensões – solução politicamente invendável depois de três anos de austeridade --, essa quebra da TSU só poderia ser compensada por transferências do orçamento do Estado, à custa de impostos ou de défice. Todavia, além de pouco viável financeiramente, salvo a título transitório, essa solução poria em causa a autossuficiência financeira da segurança social, colocando-a sempre na iminência de ser sacrificada às necessidades de consolidação orçamental.

E no entanto, a redução dos custos não salariais do trabalho faz todo o sentido, sobretudo em termos de emprego e de atenuação da contínua pressão para a redução de postos de trabalho em favor de uma cada vez maior automatização e robotização em toda a economia. Uma redução significativa da TSU empresarial sobre cada trabalhador contribuiria também para desincentivar o trabalho clandestino ou os falsos “recibos de verdes”.

2. Mas haverá algum meio de reduzir essa sobrecarga sobre os salários dos trabalhadores sem reduzir a contribuição global das empresas para a segurança social?

Talvez seja chegada a altura de revisitar uma velha proposta sindical de dividir a TSU das empresas em duas componentes, uma que continuaria a incidir sobre os salários e outra que recairia sobre o volume de negócios ou o valor acrescentado das empresas, independentemente do número de trabalhadores de cada empresa. Conforme a divisão que se adotasse -- por exemplo, metade por cada uma das referidas componentes – , poderia obter-se uma considerável redução da TSU empresarial sobre os salários de cada trabalhador. Recrutar um novo trabalhador passaria a custar bastante menos, sem qualquer redução de salário; despedir um trabalhador, traria menor poupança do que antes.

É evidente que, embora não diminuísse a contribuição global das empresas para a segurança social, um sistema misto destes implicaria uma transferência de encargos dos setores mais intensivos em trabalho (que teriam a sua contribuição diminuída) para as empresas com menos utilização de mão-de-obra (que a veriam aumentada). Todavia, esta solução favoreceria o objetivo que deve ser considerado primacial, que é a justamente a de promover a criação e manutenção de postos de trabalho e de contrariar a enorme pressão para a redução dos custos salariais do trabalho. Quando o risco principal é de crescimento sem emprego, tudo o que se fizer para combater essa tendência é bem-vindo.

13 de maio de 2015

O embuste do Governo no desmantelar dos ENVC 

Por Ana Gomes


A Comissão Europeia considerou na semana passada que o apoio financeiro que governos portugueses prestaram aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo (ENVC) ao longo de anos, no montante de 290 milhões de euros, constituia "ajudas de Estado", ilegais face às regras da concorrência europeia. E, por isso, ordenou a devolução desse montante por parte dos ENVC ao Estado.

O actual Governo, pela boca do Ministro da Defesa Nacional Aguiar Branco veio logo, publicamente, regogizar-se por esta decisão condenatória para Portugal. Esta era, precisamente, a solução que o Ministro pretendia, por ir ao encontro dos objectivos do processo de privatização que iniciou.  E que depois mudou para subconcessão. Roubando os Estaleiros ao serviço publico, especificamente à produção para a Marinha, e roubando-lhes negócios lucrativos que, bem geridos, permitiriam a sobrevivência da empresa, dos postos de trabalho de mais seiscentos trabalhadores e da sabedoria tecnológica  desenvolvida por aquela empresa, vital na economia da região de Viana do Castelo.

Ao contrário do que propagam o Ministério da Defesa e os porta vozes do PSD - como aqui neste mesmo espaço ontem ouvi o eurodeputado Paulo Rangel - o objectivo do Governo não era salvar os estaleiros. A ideia foi sempre justificar a entrega dos Estaleiros a privados! Essa é a obcessao deste Governo: entregar tudo o que possa dar lucro a privados e empobrecer, enfraquecer o Estado.E assim se compreende a fúria privatizadora na TAP, na Carris, no Metro, nos SCTP do Porto que o Governo prossegue indecorosamente, a meses de eleições legislativas! Mesmo depois de já ter mais do que alcançado o montante de receitas financeiras previstos obter através de privatizações constantes dos compromissos no Memorando assinado com a Troika. O Governo PSD/PP não privatiza porque é preciso, porque o reequilibrio das contas públicas o exige: o Governo de Passos Coelho e Portas privatiza e continua a privatizar porque quer enfraquecer o Estado e passar oportunidades de negócio do Estado a interesses privados! 

Assim, os Estaleiros Navais de VIana do Castelo foram entregues a uma subconcessionária, a West Sea, subsidiária da falida Martifer, empresa sem qualquer expertise na construção naval da envergadura dos ENVC. O Governo destruiu uma empresa que fazia parte da Base Industrial e Tecnológica da Defesa nacional e europeia e que tinha potencial económico a nível nacional e europeu se fosse bem gerida. E não acautelou o interesse público que, certamente, passava por uma gestão moderna e capaz, que há muito os Estaleiros não tinham e que era dever do Governo ter assegurado - deste e de anteriores governos, incluindo do PS, sublinho.  

Mais, os Estaleiros tinham encomendas tanto do Estado, como de privados, à data em que este Governo decidiu desmantelá-los - recordo que o Ministro da Defesa Nacional resolveu subitamente cancelar os contratos dos navios encomendados para a Marinha nacional, em vez de os manter e com eles justificar junto da Comissão Europeia as transferências financeiras feitas do Estado (Ministério das Finanças) para o Estado - os Estaleiros, que eram 100 por cento do Estado! Acresce que não construindo os  Estaleiros  os navios para a Marinha vistos na Lei de Programação Militar, esse navios vão ter, mais tarde ou mais cedo, de ser comprados no estrangeiro: estamos já a antever as oportunidades para a corrupção nas chamadas "contrapartidas", além do que perdemos numa  capacidade da indústria nacional com potencial exportador.

Tal como fez o governo espanhol relativamente aos Estaleiros do Ferrol, na Galiza, o governo português poderia ter justificado as tais "ajudas de Estado" prestadas aos ENVC com o necessário pagamento pelo Estado desses contratos de construção de navios para a nossa Marinha, há muito encomendados! Isso foi-me dito pelo próprio Comissário da Concorrência, Joaquin Almunia, quando fiz  soar os alarmes em Bruxelas. Alarmes que, recordo, também fiz soar na PGR, onde apresentei queixa fundamentada sobre o processo suspeitamente opaco da subconcessão dos ENVC - e uma investigação judicial está em curso, tanto quanto sei. 

O Ministro da Defesa poderia ter invocado também a reestruturação da empresa - outro argumento já utilizado noutros casos de suspeitas de "auxílios de Estado" a empresas, por outros Estados Membros da União Europeia. Mas já este ano, como me confirmou por escrito, a nova Comissária da Concorrência, a Sra. Vestager, o Governo português continuava a não dar explicação nenhuma a Bruxelas. Não admira, assim, que a Comissão Europeia se tenha fartado e declarado Portugal em violação das regras europeias.

O Governo, dolosamente, absteve-se de  defender o interesse nacional e também a Defesa nacional. Tudo para dar os Estaleiros a privados, votar ao desemprego tantos trabalhadores e passar as estratégicas instalações dos ENVC a uma empresa privada que dificilmente vai conseguir garantir a sua manutenção. Hoje a West Sea faz reparação naval, não faz construção naval. E emprega apenas uma pequena fração dos trabalhadores dos ENVC.

O Ministro, de resto, tentou enganar a opinião pública: durante o processo da subconcessão, deixou que pairasse a ideia de que Portugal se arriscava a ter de devolver a Bruxelas os tais 290 milhões adiantados pelo Estado aos Estaleiros. Nada mais falseador! Quando muito, estava e está em causa uma operação contabilistica: o Estado devolve ao Estado o que entregou aos Estaleiros do Estado!

É falsa, portanto, a versão que nos últimos dias o Governo voltou a propalar de que a sua era a única solução para os Estaleiros. O Governo poderia ter defendido o interesse nacional junto da Comissão Europeia, poderia ter assegurado a reestruturação da empresa pública nomeando uma  equipa de gestão competente e investindo em parcerias estratégicas para ela. Inclusive, podia ter procurado  a entrada de capitais privados nos Estaleiros, sem prescindir do controlo da empresa. Poderia ter assegurado que os Estaleiros Navais de Viana do Castelo continuassem a funcionar para promover e desenvolver uma industria em que Portugal poderia estar no mapa da Europa, nomeadamente tendo em vista o designio do nosso país voltar a aproveitar o seu potencial marítimo. 

Mas para o consórcio PSD/PP vale tudo para desarmar o Estado. 

É vital expurgarmos o País deste consórcio apostado em vender ao desbarato empresas públicas de sectores estratégicos para os entregar a interesses privados, nacionais e estrangeiros, assim efectivamente desmantelando a nossa industria, a nossa autonomia, a nossa independência e a própria segurança nacional.


(Notas de apoio à minha crónica de ontem, no Conselho Superior da ANTENA 1)
 

5 de maio de 2015

Isto está tudo ligado! pela impunidade... 

Por Ana Gomes 


Na semana passada,a imprensa noticiou buscas do Ministério Público e da Polícia Judiciária ao Ministério das Finanças, especificamente à direção dos serviços do IVA e à Secretaria Estado dos Assuntos Fiscais, por em escutas telefónicas realizadas no âmbito da Operação Labirinto, relativa a investigação sobre os "vistos dourados", terem surgido indícios sobre uma rede de tráfico de influências que lograva obter perdões fiscais em sede de IVA para certas empresas e certos empresários.

Noticiou-se que Miguel Macedo, enquanto Ministro da Administração Interna, sem interesse público que o justificasse, teria feito diligências junto do Secretário de Estado para os Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, para que a empresa ILS - Intelligence Life Solutions - do dono da Octopharma, o mesmo que contratou o ex-PM José Sócrates e que está também ser investigado -  viesse a beneficiar de isenções e reembolso de IVA, por organizar o tratamento de feridos de guerra líbios em hospitais privados portugueses.

Também veio a público que o então Ministro Miguel Macedo havia pedido ao director do SEF, entretanto detido no quadro da Operação Labirinto sobre os vistos dourados, que  acelerasse a concessão de vistos temporários para os doentes líbios. E que, num e noutro caso, a intervenção ministerial teria na base pedidos de um seu sócio numa empresa - o empresário Jaime Couto Alves, hoje preso por suspeitas no processo dos "vistos dourados", antes bem relacionado com assessores do Secretário de Estado Paulo Núncio e com funcionários dos serviços centrais do IVA para lograr a tramitação dos referidos benefícios fiscais. 

Recordo que a investigação "Labirinto" visa identificar as teias de corrupção e de tráfico de influência enredadas nos "vistos dourados". Foram já presos altos funcionários da administração Pública, mas is responsáveis  políticos continuam a assobiar para o ar, incluindo o pai dos "vistos dourados" Paulo Portas, também inventor do Secretário de Estado Núncio. Não admira, neste quadro, que o Ministro Miguel Macedo tenha recusado os meus pedidos para me facultar a lista dos beneficiários dos vistos dourados - será, só por si, muito esclarecedora das teias criminosas estrangeiras e nacionais envolvidas!

Entretanto, as buscas realizadas pela PJ e o MP revelaram mais 5 perdões fiscais de milhões de euros em sede de IVA, segundo a imprensa, fundamentados numa circular de 2009, do governo Sócrates - um esquema em que empresas não só ficam isentas de dívidas fiscais, como conseguem obter o reembolso do imposto pelo Estado. 

Paulo Núncio, o  Secretário de Estado, nega obviamente qualquer responsabilidade política na atribuição de reembolsos do IVA à ILS e outras empresas : pois não é o mesmo que nada sabia sobre a lista VIP, nem sobre as listas dos portugueses fugidos ao fisco no Liechenstein e no HSBC na Suiça?E o que esfalfa a Autoridade Tributária no combate à evasão fiscal sobre oficinas e cabeleireiras via factura da sorte, enquanto ajuda grandes evasores com a amnistia fiscal de 2012 e o estatuto dos benefícios fiscais? 

Os portugueses estão abismados, face ao intrincado das conexões entre os casos sob investigação que acima referi. De facto, isto está mesmo tudo ligado!

Nao nos basta ter um ex-Primeiro Ministro preso sob gravíssimas suspeitas - e eu repito que espero que a justiça faça o seu trabalho, rapidamente e esclarecendo tudo a fundo. Agora temos um Primeiro Ministro que tem o topete de elogiar quem devia estar preso. 

Bem percebemos que Passos Coelho, homem calhado em abrir todas as portas para a Tecnoforma, considere Dias Loureiro como seu modelo de "saber vencer na vida". Mas daí a, como Primeiro Ministro em exercício, em declarações públicas, fazer o elogio de um dos maiores responsáveis pela roubalheira ao país que foi o caso BPN?!!!

Estas declarações do Primeiro Ministro Passos Coelho são um insulto aos portugueses que vivem do seu trabalho e pagam em sobrecarregados Impostos os crimes no BPN. São também um insulto aos pequenos e médios empresários que não recorrem a sociedades offshore, nem a negociatas opacas, nem a amizades políticas para desenvolver as suas empresas, criar emprego e gerar riqueza no país.

Estas declarações de Passos Coelho só aconteceram porque isto está mesmo tudo ligado: só o sentimento de impunidade reinante é que imbui um Primeiro Ministro de uma tal desfaçatez, de uma tal sem vergonha.

É imperativo investigá-los, julgá-los e puni-los, um a um: não basta correr com eles! 


(Transcrição da minha crónica de hoje no "Conselho Superior", ANTENA 1)

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