1 de fevereiro de 2006
E a energia solar?
O consumo total de energia explodiu para alimentar o desenvolvimento económico do Portugal democrático. O país importa hoje cerca de 90% das fontes de energia de que precisa e apresenta grande dependência do petróleo (60%), tendo por consequência elevada exposição ao comportamento errático dos preços, à especulação e às vicissitudes relativas aos principais fornecedores: hoje Rússia, Nigéria, Líbia e Arábia Saudita. O impacte sobre a economia portuguesa é pesado. E pesadas são as implicações para a segurança e independência nacionais.
No capítulo ambiental, Portugal, que aumentou as emissões de gases de estufa 41% entre 1990 e 2002, tem que tomar medidas drásticas para poder cumprir os compromissos no âmbito do Protocolo de Quioto. A percentagem do consumo total de energia do país com origem em fontes renováveis encontrava-se apenas nos 14% em 2001.
Num contexto em que importa diminuir a dependência portuguesa do crude, o projecto (em que, aparentemente, todos embandeiraram em arco...) de uma nova central refinadora em Sines, embora destinada à exportação, é um contra-senso estratégico. Sem sequer falar das mais de 2,5 milhões de toneladas de emissões de CO2 a produzir por ano! Será que as mais-valias e os anunciados 800 postos de trabalho a serem criados compensam os gastos envolvidos em comprar ainda mais direitos a emissões no quadro de Quioto?
Pelos custos de produção e "limpeza", a alternativa nuclear merece ser discutida. Mas o argumento de que já estamos à mercê dos riscos por via da central espanhola de Almaraz, não pode fazer negligenciar a forte incidência sísmica do nosso território. E há mais aspectos a levar em conta: não é por acaso que a actual coligação governamental na Alemanha mantém a decisão de abandonar o nuclear.
A longo prazo e com segurança, se Portugal quiser reduzir a dependência do petróleo, ao mesmo tempo que investe em novas tecnologias e contribui para um ambiente mais limpo, precisa de tomar decisões estratégicas a favor das energias renováveis. As hídricas continuam fundamentais, mas cada vez menos suficientes.
O Plano Tecnológico e as medidas apresentadas pelo Governo no passado dia 19 anunciam justamente uma aposta nos renováveis. O investimento na biomassa e na energia das ondas justifica-se plenamente e indica vontade de promover o desenvolvimento de tecnologias em que Portugal pode vir a assumir um papel de liderança.
Mas a maior aposta parece ser na energia eólica, em que o Governo tem como objectivo quadruplicar a produção para 3.750 Mw até 2010. Este é o único 'cluster' de actividades que o Governo identifica como prioritário no Plano Tecnológico. No entanto, trata-se de uma área em que Portugal, mesmo passando a produzir componentes nacionalmente (e eventualmente a exportar), precisará entretanto de importar tecnologia estrangeira, sobretudo alemã e dinamarquesa (em boa parte através de companhias espanholas, como a omnipresente Iberdrola).
Num país que tem excepcionais condições para o aproveitamento da energia solar - muito para além da montagem de painéis solares em edifícios - porque não incentivar investigadores e investidores a apostarem na inovação tecnológica para tornarem mais eficientes, rentáveis e diversificadas as aplicações da energia solar e depois passar a comercializar e exportar as respectivas patentes e tecnologias? É difícil perceber como é que a Alemanha tinha 1.000.000 de m2 de colectores solares térmicos em 2002, a Grécia 200.000, a Finlândia 9.000 e Portugal, com uma das mais altas médias anuais de horas de Sol... 8.000m2. Números reveladores da negligência a que tem sido votada a energia solar no nosso país.
Este é um sector que deveria ser prioritário, onde Portugal deveria apostar estrategicamente na inovação e pesquisa nacional, pois já tem conhecimentos e tecnologia avançadas. O que falta é um investimento público importante para dar o salto qualitativo e quantitativo e tornar comercialmente rentável o equipamento para exploração da energia solar. Foi o que há uns anos fizeram os alemães e dinamarqueses na eólica: e por isso hoje Portugal e outros são compradores. Intriga esta omissão nos planos governamentais. Alguém explica as razões?
Por Ana Gomes, publicado no Courrier Internacional, edição de 27 de Janeiro de 2006
No capítulo ambiental, Portugal, que aumentou as emissões de gases de estufa 41% entre 1990 e 2002, tem que tomar medidas drásticas para poder cumprir os compromissos no âmbito do Protocolo de Quioto. A percentagem do consumo total de energia do país com origem em fontes renováveis encontrava-se apenas nos 14% em 2001.
Num contexto em que importa diminuir a dependência portuguesa do crude, o projecto (em que, aparentemente, todos embandeiraram em arco...) de uma nova central refinadora em Sines, embora destinada à exportação, é um contra-senso estratégico. Sem sequer falar das mais de 2,5 milhões de toneladas de emissões de CO2 a produzir por ano! Será que as mais-valias e os anunciados 800 postos de trabalho a serem criados compensam os gastos envolvidos em comprar ainda mais direitos a emissões no quadro de Quioto?
Pelos custos de produção e "limpeza", a alternativa nuclear merece ser discutida. Mas o argumento de que já estamos à mercê dos riscos por via da central espanhola de Almaraz, não pode fazer negligenciar a forte incidência sísmica do nosso território. E há mais aspectos a levar em conta: não é por acaso que a actual coligação governamental na Alemanha mantém a decisão de abandonar o nuclear.
A longo prazo e com segurança, se Portugal quiser reduzir a dependência do petróleo, ao mesmo tempo que investe em novas tecnologias e contribui para um ambiente mais limpo, precisa de tomar decisões estratégicas a favor das energias renováveis. As hídricas continuam fundamentais, mas cada vez menos suficientes.
O Plano Tecnológico e as medidas apresentadas pelo Governo no passado dia 19 anunciam justamente uma aposta nos renováveis. O investimento na biomassa e na energia das ondas justifica-se plenamente e indica vontade de promover o desenvolvimento de tecnologias em que Portugal pode vir a assumir um papel de liderança.
Mas a maior aposta parece ser na energia eólica, em que o Governo tem como objectivo quadruplicar a produção para 3.750 Mw até 2010. Este é o único 'cluster' de actividades que o Governo identifica como prioritário no Plano Tecnológico. No entanto, trata-se de uma área em que Portugal, mesmo passando a produzir componentes nacionalmente (e eventualmente a exportar), precisará entretanto de importar tecnologia estrangeira, sobretudo alemã e dinamarquesa (em boa parte através de companhias espanholas, como a omnipresente Iberdrola).
Num país que tem excepcionais condições para o aproveitamento da energia solar - muito para além da montagem de painéis solares em edifícios - porque não incentivar investigadores e investidores a apostarem na inovação tecnológica para tornarem mais eficientes, rentáveis e diversificadas as aplicações da energia solar e depois passar a comercializar e exportar as respectivas patentes e tecnologias? É difícil perceber como é que a Alemanha tinha 1.000.000 de m2 de colectores solares térmicos em 2002, a Grécia 200.000, a Finlândia 9.000 e Portugal, com uma das mais altas médias anuais de horas de Sol... 8.000m2. Números reveladores da negligência a que tem sido votada a energia solar no nosso país.
Este é um sector que deveria ser prioritário, onde Portugal deveria apostar estrategicamente na inovação e pesquisa nacional, pois já tem conhecimentos e tecnologia avançadas. O que falta é um investimento público importante para dar o salto qualitativo e quantitativo e tornar comercialmente rentável o equipamento para exploração da energia solar. Foi o que há uns anos fizeram os alemães e dinamarqueses na eólica: e por isso hoje Portugal e outros são compradores. Intriga esta omissão nos planos governamentais. Alguém explica as razões?
Por Ana Gomes, publicado no Courrier Internacional, edição de 27 de Janeiro de 2006