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23 de março de 2007

O prodígio da União Europeia 

Por Vital Moreira

Por mais complexos e difíceis que sejam os problemas que a UE actualmente enfrenta, o que avulta no cinquentenário que agora se comemora da Tratado de Roma de 1957, que criou a Comunidade Económica Europeia, é o seu enorme sucesso como experiência de integração económica e política, na base da transferência de poderes soberanos para instituições supranacionais e de um modelo político e social fundado na liberdade pessoal, nos direitos fundamentais (incluindo os direitos sociais), na democracia, na primazia do direito, na igualdade de género, na protecção de minorias, na diversidade cultural, na coesão económica, social e territorial e no respeito pelas identidades nacionais.
No seu início, depois do fracasso da Comunidade Europeia de Defesa (rejeitada pelo parlamento francês em 1954) e da ideia de uma Comunidade Política Europeia, a CEE tinha por objectivo essencial, na senda da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (1951), o estabelecimento de um "mercado comum" entre os seis Estados-membros fundadores, baseado numa economia de mercado, numa união aduaneira, na liberdade de circulação dos factores de produção e nalgumas políticas comuns (política agrícola, política de transportes, etc.).
Ninguém poderia imaginar seriamente que, meio século depois, a futura UE haveria de compreender 27 Estados-membros (vários deles outrora integrados no bloco comunista), que a integração económica haveria de evoluir para uma união económica e monetária (com a criação do Euro), que os seus objectivos haveriam de estender-se às políticas sociais, ao ambiente, à cultura, à segurança interna e à justiça, à defesa e à política externa, à política de imigração, etc. Tampouco de se poderia antecipar que a função legislativa da Comunidade haveria progressivamente de ser compartilhada por um Parlamento Europeu directamente eleito (1976) e que a inicial organização interestadual haveria de evoluir também para uma união de cidadãos, com a criação da "cidadania europeia" no Tratado de Maastricht de 1991.
Ao longo deste 50 anos, a CEE/UE foi uma factor determinante de paz europeia, de desenvolvimento económico, de redução das assimetrias nacionais e regionais, de consolidação democrática das países saídos de regimes autoritários, de reconhecimento e garantia da diversidade cultural, de defesa do meio ambiente e dos direitos dos consumidores, e "last but not the least" de afirmação do "modelo social europeu", baseado nos direitos dos trabalhadores, nos direitos sociais e nos "serviços de interesse económico geral".
Na passagem dos seus 50 anos não são poucos os desafios com que a UE se defronta. Entre eles contam-se a questão da Constituição europeia, na sequência da rejeição do tratado constitucional em 2005 na França e na Holanda, sendo ela essencial para clarificar os valores e os objectivos da União e para tornar as instituições mais democráticas, mais eficientes e mais responsáveis; a realização do "mercado interno" nos vários aspectos por concluir, como no caso da energia, dos transportes ferroviários e dos serviços; a conciliação do mercado interno no âmbito dos "serviços de interesse económico geral" com os objectivos de "serviço universal" e de acessibilidade que eles devem proporcionar; a articulação da união económica e monetária com a coordenação das políticas económicas e fiscais; a capacidade de resposta à globalização em termos de dinamismo económico, assegurando elevados níveis de emprego e o equilíbrio ecológico, bem como a preservação do "modelo social europeu"; o papel da UE na cena internacional num mundo crescentemente multipolar, ao serviço da paz e da cooperação internacional e do respeito da legalidade internacional, no quadro das Nações Unidas.
Portugal só compartilhou da história da CEE/UE em dois quintos destes 50 anos. Mas essas duas décadas constituíram uma era decisiva na consolidação democrática e no desenvolvimento e modernização do País. Se todos os Estados-membros têm razões para celebrar o nascimento da UE, vários há que têm razões especiais para isso. Portugal é um deles.

(Diário Económico, sexta-feira, 23 de Março de 2007)

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