<$BlogRSDUrl$>

4 de março de 2007

Que fazer da Constituição Europeia? 

Por Vital Moreira

Terminado o "período de reflexão" que a UE impôs a si mesma a seguir à rejeição do tratado constitucional nos referendos de França e da Holanda em 2005, a questão da Constituição Europeia voltou à agenda política europeia. A presidência alemã anunciou desde logo que esse tema estaria entre as suas prioridades, estando já marcado para Junho uma cimeira sobre o "Futuro da Constituição da UE", tendo pelo meio as comemorações do 50º aniversário do Tratado de Roma, em 9 de Junho, e uma muito esperada "Declaração de Berlim" sobre o futuro da UE, em 25 de Março, que poderá anunciar a reabertura do processo constitucional.
Mas será que a aprovação da Constituição pelos 27 Estados-membro (até agora só 18 o fizeram) é viável neste momento, não somente pelos dois países que já a rejeitaram, mas também pelos que entretanto reforçaram as suas reservas contra ela?
Depois de um encontro dos países que aprovaram a Constituição, reunida em Madrid no final de Janeiro, decorreu agora a reunião dos que ainda a não ratificaram. A par desses encontros formais, vão sendo produzidas afirmações desgarradas de dirigentes políticos nacionais sobre o futuro do tratado constitucional, oscilando entre os que entendem que ele deve avançar sem nenhuma alteração substancial até aos que defendem que ele deve ser abandonado e substituído por um tratado "de via reduzida", restrito às questões institucionais (presidente permanente do Conselho, composição da Comissão, votações por maioria, ministro dos negócios estrangeiros, etc.), sem mexer no resto dos actuais tratados.
Não são visíveis progressos na convergência de posições e de soluções. O panorama político também não ajuda a fazer previsões. Entre os factores decisivos contam-se as eleições presidenciais e legislativas francesas (em Abril, Maio e Junho, respectivamente), a saída de Tony Blair da chefia do Governo britânico e sua substituição por Gordon Brown, em data indefinida, mas provavelmente antes do Verão. Ora, nenhum destes acontecimentos políticos favorece a Constituição europeia.
No caso francês, enquanto Ségolène Royal preconiza um reforço da componente social do documento (para o que escasseiam as condições no actual panorama político europeu) e um novo referendo, já Nicolas Sarkozy é um dos defensores de um mini-tratado, puramente institucional, o que permitiria dispensar novo referendo em França. No caso da Grã-Bretanha, Brown é seguramente bem menos adepto de uma constituição europeia do que Blair, sobretudo se incluindo uma "carta social" adicional, sendo provável o seu alinhamento com uma posição próxima de Sarkozy. Somente grandes ganhos noutras áreas (por exemplo, a reforma da Política Agrícola Comum e na liberalização económica) poderiam eventualmente demover a resistência britânica.
Se a isto se juntar o pouco ou nenhum entusiasmo de outros governos, como o polaco, pelo texto assinado em Roma em 2004, mesmo no que respeita ao arranjo institucional, então temos um horizonte pouco auspicioso, que nem o voluntarismo de Angela Merkel poderá superar. Se falhar a cimeira sobre o tema prevista para Junho, o mais provável é que a presidência portuguesa, no segundo semestre, venha herdar um dossier sem saída à vista e se limite constatar a falta de condições para insistir no texto pendente de ratificação.
E, no entanto, há um consenso generalizado de que, depois do recente alargamento a 27 membros (e mais algumas adesões na calha), a UE se tornou dificilmente governável com os actuais mecanismos institucionais e procedimentais. Os factores de paralisia e de verificação de impasses são muito fortes. Há que reformar os actuais tratados sem muita demora, a tempo de estarem operacionais antes das próximas eleições europeias, em 2009.
A alternativa, então, afigura-se ser esta: ou se insiste no texto pendente de ratificação, aguardando o tempo que for preciso para que amadureçam as condições necessárias para uma eventual aprovação; ou se abandona essa ambição, por agora, e se concentram esforços em objectivos mais limitados, mas mais alcançáveis no curto prazo. Há momentos em que um compromisso de médio alcance é melhor do que nenhum.

(Diário Económico, 28 de Fevereiro de 2007)

This page is powered by Blogger. Isn't yours?