5 de junho de 2007
Defesa anti-míssil: Congresso EUA faz-se ouvir
A imprensa portuguesa salientou que a Assembleia Parlamentar da NATO, que reuniu no final da passada semana na Madeira, discutiu o projecto americano de colocação de um radar na República Checa e mísseis interceptores na Polónia, projecto que está a desencadear fortes reacções, na Rússia em particular. A maioria dos jornais, porém, limitou-se a reproduzir, com intermediação de José Lello e LUSA, argumentos de Daniel Fata, o representante da Administração Bush que veio defender o plano. Mostrou-se assim indiferente ao que foi dito de novo e muito relevante na Madeira: que a Câmara dos Representantes há duas semanas cortou os fundos (mais de 760 milhões de dólares) que deveriam pagar a instalação desses equipamentos na Polónia e na República Checa; e que, se a Administração queria prosseguir o plano, que fizesse o "trabalho de casa", articulando-se antes devidamente com os aliados e parceiros da NATO, Rússia incluída. Disse-o uma voz autorizada, que o Sr. Fata não se atreveu a contestar: a da Congressista Ellen Tauscher (Democrata, da Califórnia), que preside à Subcomissão de Forças Estratégicas.
Na Europa a importância do tema exige mais do que indiferença ou deferência: a proliferação de armas de destruição maciça constitui um dos maiores perigos para a Humanidade, frisa-o a Estratégia Europeia de Segurança. A tecnologia míssil, em particular, ainda há poucas décadas só nas mãos de algumas potências, hoje espalha-se como um cancro.
É em nome da ameaça balística e nuclear iraniana (indisputável, embora haja divergências sobre a melhor forma de lidar com ela) que os EUA querem colocar parte do seu sistema de defesa anti-míssil no continente europeu. Mas, como se confirmou no debate na Madeira, não passa despercebido aos aliados europeus o facto da Administração Bush ter contornado NATO e a UE, escolhendo como interlocutores "bilaterais" Varsóvia e Praga: dividir para reinar...
O projecto sofre de três problemas de fundo, como o debate na Madeira expôs: a questão técnica; as consequências políticas (proliferação incluida); e a credibilidade da fonte.
Quanto à questão técnica, sabe-se muito pouco. O Governo de Bush diz querer ter a secção europeia do sistema a funcionar em 2012, prevendo gastar €2,6 mil milhões. Está disposto a enterrar esta soma astronómica num projecto cuja viabilidade técnica é posta em causa pelo Government Accountabilty Office, instituição americana comparável ao Tribunal de Contas português, que explicou em Março "ainda não é possível avaliar a viabilidade deste projecto porque não houve testes suficientes para confirmar empiricamente os modelos e simulações que lhe subjazem"!
É em nome de um projecto que Ellen Tauscher considera "de alto risco e imaturo", que a Administração Bush quer arriscar uma nova corrida aos armamentos, nomeadamente com a Rússia. Claro que o poder dissuasor garantido pelo enorme arsenal balístico de Moscovo não é posto em causa pelo segmento europeu do sistema americano; mas também é verdade que este sistema de defesa anti-míssil a médio prazo desvalorizará os arsenais das outras grandes potências. Ora, como disse Sergei Ivanov, vice-Primeiro Ministro russo "para cada escudo se encontra uma espada mais eficaz": mesmo sendo fiável, o sistema só funciona até ao dia (a chegar sempre mais depressa do que se pensa) em que alguém invente um míssil maior, mais rápido ou menos visível no radar...
E, por fim, surge a questão da credibilidade. Em quem acreditar: nos cépticos no Congresso americano que já começaram a cortar fundos ao projecto e naqueles, na Europa, que temem que ele divida a UE, menorize a NATO e diminua probabilidades de uma verdadeira Política Europeia e de Segurança Comum? ou numa Administração Bush de credibilidade nula, entusiasta de soluções militares "na hora", desesperada por deixar qualquer legado de segurança aos EUA - perante um Iraque fora de controlo, um Irão galvanizado e uma Coreia do Norte em roda livre ?
Na Europa a importância do tema exige mais do que indiferença ou deferência: a proliferação de armas de destruição maciça constitui um dos maiores perigos para a Humanidade, frisa-o a Estratégia Europeia de Segurança. A tecnologia míssil, em particular, ainda há poucas décadas só nas mãos de algumas potências, hoje espalha-se como um cancro.
É em nome da ameaça balística e nuclear iraniana (indisputável, embora haja divergências sobre a melhor forma de lidar com ela) que os EUA querem colocar parte do seu sistema de defesa anti-míssil no continente europeu. Mas, como se confirmou no debate na Madeira, não passa despercebido aos aliados europeus o facto da Administração Bush ter contornado NATO e a UE, escolhendo como interlocutores "bilaterais" Varsóvia e Praga: dividir para reinar...
O projecto sofre de três problemas de fundo, como o debate na Madeira expôs: a questão técnica; as consequências políticas (proliferação incluida); e a credibilidade da fonte.
Quanto à questão técnica, sabe-se muito pouco. O Governo de Bush diz querer ter a secção europeia do sistema a funcionar em 2012, prevendo gastar €2,6 mil milhões. Está disposto a enterrar esta soma astronómica num projecto cuja viabilidade técnica é posta em causa pelo Government Accountabilty Office, instituição americana comparável ao Tribunal de Contas português, que explicou em Março "ainda não é possível avaliar a viabilidade deste projecto porque não houve testes suficientes para confirmar empiricamente os modelos e simulações que lhe subjazem"!
É em nome de um projecto que Ellen Tauscher considera "de alto risco e imaturo", que a Administração Bush quer arriscar uma nova corrida aos armamentos, nomeadamente com a Rússia. Claro que o poder dissuasor garantido pelo enorme arsenal balístico de Moscovo não é posto em causa pelo segmento europeu do sistema americano; mas também é verdade que este sistema de defesa anti-míssil a médio prazo desvalorizará os arsenais das outras grandes potências. Ora, como disse Sergei Ivanov, vice-Primeiro Ministro russo "para cada escudo se encontra uma espada mais eficaz": mesmo sendo fiável, o sistema só funciona até ao dia (a chegar sempre mais depressa do que se pensa) em que alguém invente um míssil maior, mais rápido ou menos visível no radar...
E, por fim, surge a questão da credibilidade. Em quem acreditar: nos cépticos no Congresso americano que já começaram a cortar fundos ao projecto e naqueles, na Europa, que temem que ele divida a UE, menorize a NATO e diminua probabilidades de uma verdadeira Política Europeia e de Segurança Comum? ou numa Administração Bush de credibilidade nula, entusiasta de soluções militares "na hora", desesperada por deixar qualquer legado de segurança aos EUA - perante um Iraque fora de controlo, um Irão galvanizado e uma Coreia do Norte em roda livre ?