21 de maio de 2013
A moção de censura do PS
Conselho Superior , Antena 1,
2 de Abril 2013
Na semana passada vimos algumas personagens da coligação governamental, sobretudo do PSD, rasgarem as vestes por causa da moção de censura apresentada pelo PS, apodando-a de irresponsável e até de antipatriótica.
Disseram que o país seria assim atirado para uma crise política que agravaria as condições de recuperação da economia, pondo em xeque a convergência alargada que seria essencial para o cumprimento do programa de ajustamento, perante os credores e parceiros europeus. E que também comprometeria o regresso do país aos mercados - esse mítico regresso que está já obviamente também comprometido pela gestão desastrosa da crise de Chipre por parte do Eurogrupo.
Outras personalidades, conjugando a moção de censura do PS com a aguardada decisão do Tribunal Constitucional, admitem que o Governo seja tentado a demitir-se se for confrontado não apenas com um segundo veredicto de inconstitucionalidade em dois orçamentos seguidos, mas sobretudo com um veredicto que tenha pesadas implicações orçamentais, para as quais o Governo já foi adiantando não ter plano B - isto é, não ter alternativa.
Note-se que o núcleo duro do Governo pôs também a circular na imprensa que o primeiro-ministro consideraria nessas condições demitir-se. Tudo isto para reforçarem o argumento do desastre para a posição de Portugal na Europa que resultaria do país ser precipitado num processo eleitoral antecipado para as legislativas, com a agravante de haver já autárquicas previstas para Outubro e europeias em Maio do próximo ano.
Ora os motivos da moção de censura do PS metem-se pelos olhos e pelos bolsos dos portugueses dentro:
- O não cumprimento do governo de quaisquer das metas macroeconómicas fixadas;
- A divida pública que cresce exponencialmente;
- O desemprego pornográfico que nos jovens atinge já 40 %,
- A destruição do tecido económico e social;
- A ausência de qualquer política económica consistente por parte do Governo, incapaz até de fazer a banca cumprir o seu papel de financiar as empresas, banca essa que está a ser financiada pelos contribuintes;
- A ausência de uma política europeia que defenda os interesses nacionais;
- A espiral de corrupção que prossegue na captura do Estado: veja-se o recente episódio de integração na presidência do Conselho de Ministros de um espião que está a ser investigado e que vai ser julgado por abuso de poder, utilização do Estado em favorecimento de empresas e outras malfeitorias; um episódio que denota o total desnorte e, no fundo, a falta de autoridade do Primeiro-Ministro.
Estamos nesta situação desastrosa e insuportável a que nos conduziu o governo de Passos Coelho, perante o silêncio cúmplice do Presidente da República. É também para o frizar que serve a moção de censura do PS: não apenas para marcar a sua ruptura com as políticas desastrosas do Governo, mas para dar nota ao Senhor Presidente da República, e à Europa, que não é possível continuar a invocar o amplo consenso político nacional para prosseguir com as mesmas políticas desastrosas que estão a destruir Portugal.
Como bem sabemos, a moção de censura não determina a queda do Governo, visto que a coligação tem maioria na Assembleia da República. Mas conjugada com a decisão do Tribunal Constitucional, ela pode de facto vir a obrigar o Governo a demitir-se.
No meu ponto de vista é desejável que o Governo se demita quanto antes, e que o Presidente da República devolva a palavra ao povo também o quanto antes.
O PS já disse, e redisse, que só voltará a assumir responsabilidades governativas depois de eleições.
Dizem alguns, como o Professor Rebelo de Sousa, que precipitar o país em eleições é precipitar o país em crise.
Mas em crise gravíssima política, económica e moral, não está já hoje o país?
Mas não é sinal de tremenda crise, no seio da coligação, o parceiro menor vir publicamente pedir a remodelação do Governo, e apontar a falta de coordenação política ao primeiro-ministro?
Aqueles que pensam que este governo já não é remodelável mas que querem evitar eleições antecipadas, defendem que se deveria arranjar um governo de iniciativa presidencial, chefiado por alguma personalidade realmente social democrática que ainda reste no PSD; ou alguém com perfil tecnocrático, capaz de levar à Assembleia de República um programa que reúna amplo apoio partidário e que encabece a legislatura até ao fim. Ora, uma solução destas supunha que tivéssemos um Presidente da República capaz de arriscar e de respaldar um Governo com condições de actuação muito difíceis, nacionalmente e na Europa. E não temos esse Presidente da República.
É sobretudo a pensar na importância decisiva da renegociação do memorando de entendimento para podermos sair da crise e pormos a nossa economia de novo a crescer, que considero ser fundamental que não percamos mais tempo e avancemos para eleições legislativas.
Só um Governo de legitimidade incontestada, saído de eleições poderá ter a força para essa renegociação com os nossos parceiros europeus. Esse governo não tem de ser só um governo do PS, nem deve ser o um Governo só do PS, mesmo que o PS obtenha uma maioria significativa em eleições. Esse governo tem de ser de salvação nacional, tão abrangente quanto possível, da esquerda à direita, congregando personalidades com competência para fazerem as escolhas e adoptarem as politicas que a reorientação da economia impõe. E para renegociarem na Europa, sem subserviências, e com uma visão estratégica nacional e europeísta que a saída da crise exige.