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3 de janeiro de 2014

A Guiné Bissau prova que a PCSD da UE é precisa 

O gravissimo acto de coacção exercido em Bissau sobre a tripulação do avião da TAP que foi forçada a transportar para Lisboa um grupo de 74 pessoas portadoras de  passaportes falsos  prova que o falhanço do funcionamento do Estado na Guiné Bissau não põe apenas em causa a governação, o desenvolvimento  e a segurança  do povo da Guiné Bissau e dos seus vizinhos, mas constitui uma ameaça à Segurança e Defesa de Portugal  e, portanto, da própria Europa.

Fizeram bem as autoridades portuguesas em acolher os adultos e crianças trazidos de Bissau  e em analisar, porventura com a ajuda do ALto Comissariado  das Nações Unidas para os Refugiados, os pedidos de asilo político que à chegada submeteram: se forem de facto sírios a fugir da guerra no seu país, independemente dos meios fraudulentos a que terão recorrido para chegar a país seguro, certamente merecerão o estatuto, o apoio e o acolhimento como refugiados. E não sendo sírios, se forem Somalis, Eritreus, Etiopies ou Sudaneses certamente também se qualificarão para receber refúgio humanitário, visto provirem de países em conflito ou com regimes odiosamente opressores. 

Mas é mesmo essencial proceder-se a uma cuidadosa verificação da identidade e dos antecedentes de quem chegou. Porque misturados com genuínos refugiados podem estar agentes de organizações de malfeitores, inclusive terroristas, com planos de infiltraçao para a prazo desenvolver actividades criminosas a partir do nosso país: sabemos hoje que este não foi um episódio isolado desde que a GUINÉ Bissau  se transformou, lamentavelmente, numa plataforma para o narco-tráfico e outras redes de criminalidade organizada que têm a Europa como alvo  e usam território e cumplicidades  noutros países africanos. Saliento, neste contexto, o significado de se ter demitido o MNE guineense, Delfim Silva, por não querer mais estar associado aos traficantes de droga e de seres humanos com assento no grupo que se intitula governo em Bissau.

A confirmar que este incidente, envolvendo a responsabilidade de quem se intitula ministro do interior guineense, realmente é visto como uma grave ameaça á segurança da Europa, ouvimos a uma declaração de forte alarme e de forte linguagem sobre a Guiné Bissau à Alta Representante e Vice Presidente da Comissão Europeia,  Sra. Catherine Ashton. Mas este não é tempo para a EU exercitar a retórica: é tempo de agir, de passar á acção e de não deixar degradar ainda mais a situação na Guiné Bissau.

Porque a verdade é que esta degradação estava nas cartas e para ela também contribuiu a UE,  certamente sem querer, mas contribuiu... Por decisão da própria senhora Ashton e do Conselho de Ministros para as Relações Externas e a segurança e defesa da UE, a que preside. Decisão que no PE eu e outros deputados criticámos  e procurámos fosse corrigida: estou a referir-me á decisão de retirar a missão de PCSD que a UE tinha enviado para Bissau para apoiar/incitar a reforma do sector de segurança e que devia ter mandado os militares de volta aos quartéis, em vez de os deixar dominar a vida politica e económica da Guiné Bissau. Essa decisão ocorreu em 2009, a pretexto de reagir aos brutais assassinatos de Nino Vieira e seu CEMGFA,  já então entendidos como ajustes de contas entre narco traficantes.  Mas essa era razão para reforçar e intensificar a missão, em vez de a retirar. Retirá-la só equivaleria a UE lavar dali as mãos e abandonar a Guiné Bissau à sua sorte: e assim, uns meses depois, ocorreu o golpe de Estado que depôs o governo e presidentes interinos legítimos e interrompeu o processo eleitoral. A ONU assumiu então o processo, complicado pela dimensão regional e de rivalidade continental  - afinal o golpe foi apoiado pela ECOWAS, dominada pela Nigéria, em despique com Angola (ECOWAS que UE e ONU consideram parceiro credível na África ocidental.!...) E os meios da ONU, apesar no investimento no Representante Especial do SGNU Ramos Horta eram e são escassos e insuficientes para  fazer  o pais reentrar na legalidade e na governação. Em todo este processo, Portugal falou baixinho, sempre muito baixinho e mansamente, manietado pelos complexos coloniais que continuam a dominar  responsáveis políticos pela nossa política externa, á esquerda e a direita...

Pelos intensos  laços humanos e históricos com a Guiné Bissau não admira que Portugal esteja na linha a frente das ameaças colocadas á Europa pelo Estado falhado em Bissau. É tempo, também aqui de Portugal falar audivelmente em Bruxelas e pedir mais do que retórica: acção. Acção pondo em prática a doutrina  da Política Comum de Segurança e Defesa que a UE vem apurando, com mobilização conjunta dos meios, civis e militares, de que os vários Estados Membros dispõem para travar a espiral criminosa que assentou arraiais em Bissau. Agindo obviamente com mandato do CSNU e em articulação com a missão da ONU no terreno e, desejavelmente, em parceria com a União Africana.

Sei demasiado bem que a Guiné Bissau não é o único ponto quente na rota da criminalidade organizada, do terrorismo e outras ameaças aos Estados na Africa Ocidental, e muito menos é desligável da degradação da segurança  na Líbia, no Mali e na Republica Centro Africana e na região do Sahel no seu conjunto. Sei que este incidente em Bissau dá o alarme incontornável que é tempo de agir, e agir coordenadamente na UE e na ONU. E que não é Portugal sozinho! ou qualquer outro EStado Membro sozinho que pode agir: precisamos de accionar a PCSD - Política Comum de Segurança e Defesa da UE e combiná-la com políticas de desenvolvimento e reestruturação democrática que ajudem a restaurar segurança humana na GUiné Bissau e na região.  Os governos europeus não podem continuar a deixar França avancar sozinha , seja no Mali,  seja na Rep. Centro Africana, ou descoordenadamente como na Líbia, para fazer face a ameaças que afectam a segurança europeia no seu conjunto.

Este semana reúne o Conselho Europeu e de Ministros dos Negócios Estrangeiros e de Defesa. E é suposto discutir e tomar decisões nesta matéria. Precisamos que seja revisto o esquema de repartição dos custos de missões de PCSD, para que um país que tem militares, policias ou  juristas capazes de fazer a diferença possa contribuir com o seu trabalho, enquanto outros que não participam com forças ou recursos humanos, contribuam também, pagando pelo menos os encargos financeiros dessas missões. Precisamos de  aproveitar melhor os recursos e identificar os meios para responder as ameaças  e responsabilidades no plano da defesa e segurança marítima : em Portugal, por exemplo falamos muito das oportunidade económicas que vai abrir o Canal do Panamá alargado, mas nada se diz sobre as ameaças, os riscos e responsabilidades acrescidos que dele vão derivar. E a que nunca conseguiremos responder sózinhos! Razão porque precisamos  absolutamente de nos bater pela activação da PCSD - com a vantagem de que no plano marítimo, aéreo ou terrestre, ela colocará Portugal no mapa e valorizará os nossos recursos, geográficos ou humanos, civis e militares, diplomáticos e económicos. Portugal pode e deve ser actor na PCSD e precisa da PCSD - como a Guiné Bissau mete pelos olhos de todos dentro.


NOTA: este é o texto que serviu de base à minha intervenção no "Conselho Superior" na ANTENA1 em 17 de Dezembro de 2013

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