25 de março de 2014
Articulação PE/Congresso EUA contra impunidade evasão e fraude fiscais
Estou a falar-vos de Washington, onde participo no Diálogo Transatlântico que acontece duas vezes por ano entre parlamentares europeus e americanos.
Ontem tive uma reunião com o Senador Carl Levin e seus colaboradores, para articularmos esforços na investigação sobre o papel da banca suiça na organização da fraude e da evasão fiscais tanto nos EUA, como na Europa e globalmente - este é tema de uma audição que eu propus no PE, que deve ter lugar na próxima semana e para a qual foram já convidados representantes dos principais bancos suíços.
O Senador Democrata Carl Levin preside à Subcomissão Permanente de Investigações do Senado que, a 26 de Fevereiro passado, discutiu um relatório sobre a ocultação de contas bancárias, transferências de dinheiro e outros esquemas ilegais usados pelo banco Crédit Suisse para orquestrar a evasão fiscal de milhares de cidadãos americanos. Em 2008 já aqui tinha havido uma investigação sobre outro banco suíço, a UBS, que foi condenado a pagar uma colossal multa e a identificar os clientes americanos que a ele recorriam para fugir aos impostos. Nesta ultima audição, o Senador Levin instou o Departamento de Justiça dos Estados Unidos a exigir o mesmo ao Crédit Suisse e a pedir à Suíça a extradição dos responsáveis por este tipo de criminalidade organizada.
Estes esquemas de crime altamente sofisticado, operacionalizados por bancos na Suíça e em paraísos fiscais, não tem impacto apenas nos cofres públicos americanos. Os Estados Membros da UE são ainda mais prejudicados, nas receitas orçamentais e no efeito devastador da confiança dos cidadãos relativamente aos governantes, às administrações, aos sistema de Justiça e aos políticos em geral.
Em Portugal, para além do escândalo das prescrições judiciais de que beneficiam banqueiros e corruptos, não é possível passar uma esponja sobre as obscenas amnistias fiscais concedidas pelo Governo em 2012 e 2013, permitindo aos detentores de contas escondidas na Suíça e noutros países a «limpeza» dos seus crimes fiscais, com garantia de sigilo sobre os beneficiários e sobre a origem do património: um autêntico mecanismo de branqueamento de capitais para ricos e poderosos, com patrocínio do Governo e benção da Troika. Os mesmissimos que, em contrapartida, neste país onde aumenta a desigualdade, arrancam couro e cabelo em impostos e cortes de salários, de pensões e de prestações sociais às classes médias e aos pobres, alegando que não há dinheiro - pudera, nada fazem para o ir buscar à Suíça e a outros paraísos fiscais para onde continuam a deixá-lo partir!
Mas este não é um problema exclusivamente português: é um problema europeu e um daqueles que só se resolve se actuarmos a nível europeu, para termos impacto também no plano global. E é por isso que o Senador Levin e eu combinámos passar a trocar informação e articular esforços.
Este é um problema que merece estar no centro dos debates sobre a Europa que temos e sobre a Europa que queremos, e portanto sobre aquilo que temos de mudar na UE. É questão que devemos discutir no quadro da campanha eleitoral para o Parlamento Europeu que aí temos à porta - e não é por acaso, certamente, que sobre isto nada diz o Presidente da Republica, quando nos incentiva a discutir as questões europeias.
A reforma fiscal, incluindo o combate à evasão e fraude fiscais, é assunto fundamental, que não podemos permitir que o Governo remeta para especialistas em ciências ocultas ou para expedientes aviltantes da cidadania, como as facturas habilitadoras ao sorteio de automóveis topo de gama...
Sobre a reforma fiscal todos os partidos políticos devem ter posições claras, explicando como tencionam dar combate à criminalidade fiscal e aos paraísos fiscais. Numa perspectiva progressista - que é a do Partido Socialista nacional e europeu - isso passa também pelo caminho da harmonização fiscal na UE, contra a rivalidade na "selva fiscal".
Claro que a coligação de direita ainda no poder em Portugal, em ultima análise, dirá que a harmonização fiscal na UE é de realização remota, para justificar nada fazer nesse sentido. É a atitude de quem, desde que chegou ao governo, abdicou de defender os interesses nacionais - e os europeus - no Conselho Europeu. Como ainda recentemente se comprovou na negociação sobre a União Bancária: se não fosse o PE, sob a direcção competente e tenaz da deputada socialista Elisa Ferreira, teria vingado a versão alemã, a que o Governo de Passos Coelho dera acordo subserviente em Dezembro, apesar de ser desastrosa para Portugal, para a banca portuguesa e para a UE no seu conjunto. O PE e os socialistas no PE provaram que é possível negociar e desentortar a agulha da Europa. Na União Bancária, como na harmonização fiscal e como no combate contra a criminalidade organizada que se vale da banca sem escrúpulos e dos paraísos fiscais.
NOTA: texto que escrevi para a minha intervenção desta manhã no "Conselho Superior", Antena 1. Começando pelo fim e sem tempo para dizer tudo...