14 de abril de 2015
Base das Lajes - ou de como o Governo não defende o interesse nacional
Por Ana Gomes
Estive na semana passada nos Açores, onde me inteirei do impacto social e económico da diminuição do efectivo militar americano na Base das Lajes - que já estava nos planos de reestruturação das Forças Armadas desde o Governo de George W. Bush e foi formalmente confirmada pelo Governo de Obama ao Governo português em Novembro de 2012.
OS EUA não querem abandonar os Açores: querem continuar a ter o domínio da Base das Lajes e do porto da Praia da Vitória, mas em regime "low cost" - com um mínimo de pessoal, americano e português, e custos mínimos. Querem passar de 650 militares americanos para 160. E deixar de empregar metade dos 800 portugueses até ao Outono deste ano. Já iniciaram há dois anos as reduções dos tempos das comissões de serviço, do acompanhamento de militares por familiares, já fecharam a escola americana e diversos serviços na Base. Por isso, de facto, a economia da Ilha Terceira já está a sofrer forte impacto social e económico, a somar-se ao da crise nacional e europeia, calculando-se que, em consequência, o desemprego na ilha atinja 55 por cento e leve à emigração de 10 a 15 mil terceirenses nos próximos dez anos. Um desastre nacional, regional e local que está a acontecer, sem que se fale dele em Portugal...
Em 2006 os EUA também quiseram fazer o mesmo e mudar para um esquema "low cost" a sua operação na base área de Keflavik, na Islândia, onde também já estavam desde a II Guerra Mundial e tinham 900 militares estacionados. Mas a minúscula Islândia tinha um governo capaz de defender os interesses nacionais e, em seis meses, negociou diplomaticamente, fazendo compreender a Washington que, ou ficava como estava, ou largava de todo a base, pagando compensações e a reconversão das instalações para outro uso: o impacto foi absorvido e desde 2006 a base tem uso civil, servindo a guarda costeira islandesa.
Em Portugal, o governo de Passos Coelho e Portas fechou-se em copas, entrou em negação apesar dos americanos o terem repetidamente avisado (a açoreana que é Secretária de Estado da Defesa, Berta Cabral, protagonizou até recentemente um episódio trágico-cómico negando que o Governo conhecesse os planos americanos de redução do efectivo da Base). O Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros e depois Vice Primeiro Ministro, Paulo Portas, descurou a negociação político- diplomática e acreditou parolamente que, adulando meia dúzia de congressistas americanos de origem portuguesa, o Governo travava o processo; o MNE sob sua direção continuou a desvalorizar a importância de ter a intervir no processo negocial o Governo da Região Autónoma dos Açores e os Presidentes eleitos nos municípios afectados na Ilha Terceira, Praia da Vitória e Angra do Heroísmo; ignorou olimpicamente o interesse negocial que poderia extrair da mobilização de deputados, tanto no Parlamento nacional como no Parlamento Europeu; descurou exigências que poderia e deveria ter feito ao anfitrião da Cimeira da Guerra nas Lajes em 2003, Durão Barroso, ainda como Presidente da CE. E sobretudo desdenhou, estupidamente, da importância estratégica e táctica de equacionar outros usos, civis e/ou militares, para a Base das Lajes e para o porto da Praia da Vitória nos planos nacional e europeu.
Volto dos Açores indignada com a incapacidade e incompetência do Governo de Passos Coelho e Paulo Portas para reagir política e diplomaticamente, a tempo e horas, e levar as autoridades americanas a pelo menos acautelar interesses dos trabalhadores portugueses na Base, pagar reparações, compensações e os custos de medidas de adaptação e mitigação dos impactos que forem mitigáveis, incluindo a descontaminacão de solos e águas que podem levar décadas e custar centenas de milhões de euros. Volto abismada com a total incapacidade e desinteresse do Ministério da Economia e do Ministério da Defesa para identificarem alternativas ou sequer o uso a dar as infraestruturas existentes, incluindo à verdadeira pequena cidade que os americanos construíram na Base, com muitos edifícios que queriam ter entregues a Portugal, que já abandonaram e que estão já a degradar-se.
Sublinho que em documentos do Governo Regional e da Câmara da Praia da Vitória não faltam sugestões de medidas a tomar, de destinos alternativos a dar a infraestruturas e de projectos de investimento em adaptações, formação, relançamento empresarial e tecnológico etc. para mitigar os impactos e aproveitar a reconversão em reforço dos clusters nacionais aéreo e do mar. Acresce que os próprios americanos reconhecem o impacto devastador na economia regional, tendo chegado a mandar uma equipa fazer o seu levantamento.
Estive na semana passada nos Açores, onde me inteirei do impacto social e económico da diminuição do efectivo militar americano na Base das Lajes - que já estava nos planos de reestruturação das Forças Armadas desde o Governo de George W. Bush e foi formalmente confirmada pelo Governo de Obama ao Governo português em Novembro de 2012.
OS EUA não querem abandonar os Açores: querem continuar a ter o domínio da Base das Lajes e do porto da Praia da Vitória, mas em regime "low cost" - com um mínimo de pessoal, americano e português, e custos mínimos. Querem passar de 650 militares americanos para 160. E deixar de empregar metade dos 800 portugueses até ao Outono deste ano. Já iniciaram há dois anos as reduções dos tempos das comissões de serviço, do acompanhamento de militares por familiares, já fecharam a escola americana e diversos serviços na Base. Por isso, de facto, a economia da Ilha Terceira já está a sofrer forte impacto social e económico, a somar-se ao da crise nacional e europeia, calculando-se que, em consequência, o desemprego na ilha atinja 55 por cento e leve à emigração de 10 a 15 mil terceirenses nos próximos dez anos. Um desastre nacional, regional e local que está a acontecer, sem que se fale dele em Portugal...
Em 2006 os EUA também quiseram fazer o mesmo e mudar para um esquema "low cost" a sua operação na base área de Keflavik, na Islândia, onde também já estavam desde a II Guerra Mundial e tinham 900 militares estacionados. Mas a minúscula Islândia tinha um governo capaz de defender os interesses nacionais e, em seis meses, negociou diplomaticamente, fazendo compreender a Washington que, ou ficava como estava, ou largava de todo a base, pagando compensações e a reconversão das instalações para outro uso: o impacto foi absorvido e desde 2006 a base tem uso civil, servindo a guarda costeira islandesa.
Em Portugal, o governo de Passos Coelho e Portas fechou-se em copas, entrou em negação apesar dos americanos o terem repetidamente avisado (a açoreana que é Secretária de Estado da Defesa, Berta Cabral, protagonizou até recentemente um episódio trágico-cómico negando que o Governo conhecesse os planos americanos de redução do efectivo da Base). O Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros e depois Vice Primeiro Ministro, Paulo Portas, descurou a negociação político- diplomática e acreditou parolamente que, adulando meia dúzia de congressistas americanos de origem portuguesa, o Governo travava o processo; o MNE sob sua direção continuou a desvalorizar a importância de ter a intervir no processo negocial o Governo da Região Autónoma dos Açores e os Presidentes eleitos nos municípios afectados na Ilha Terceira, Praia da Vitória e Angra do Heroísmo; ignorou olimpicamente o interesse negocial que poderia extrair da mobilização de deputados, tanto no Parlamento nacional como no Parlamento Europeu; descurou exigências que poderia e deveria ter feito ao anfitrião da Cimeira da Guerra nas Lajes em 2003, Durão Barroso, ainda como Presidente da CE. E sobretudo desdenhou, estupidamente, da importância estratégica e táctica de equacionar outros usos, civis e/ou militares, para a Base das Lajes e para o porto da Praia da Vitória nos planos nacional e europeu.
Volto dos Açores indignada com a incapacidade e incompetência do Governo de Passos Coelho e Paulo Portas para reagir política e diplomaticamente, a tempo e horas, e levar as autoridades americanas a pelo menos acautelar interesses dos trabalhadores portugueses na Base, pagar reparações, compensações e os custos de medidas de adaptação e mitigação dos impactos que forem mitigáveis, incluindo a descontaminacão de solos e águas que podem levar décadas e custar centenas de milhões de euros. Volto abismada com a total incapacidade e desinteresse do Ministério da Economia e do Ministério da Defesa para identificarem alternativas ou sequer o uso a dar as infraestruturas existentes, incluindo à verdadeira pequena cidade que os americanos construíram na Base, com muitos edifícios que queriam ter entregues a Portugal, que já abandonaram e que estão já a degradar-se.
Sublinho que em documentos do Governo Regional e da Câmara da Praia da Vitória não faltam sugestões de medidas a tomar, de destinos alternativos a dar a infraestruturas e de projectos de investimento em adaptações, formação, relançamento empresarial e tecnológico etc. para mitigar os impactos e aproveitar a reconversão em reforço dos clusters nacionais aéreo e do mar. Acresce que os próprios americanos reconhecem o impacto devastador na economia regional, tendo chegado a mandar uma equipa fazer o seu levantamento.
Quem tem falhado, está a falhar, clamorosamente, é o Governo português, apesar de PR e governo tanto falarem da centralidade do mar para uma estratégia de desenvolvimento nacional e de afirmação externa: na verdade ignoram, desvalorizam e desperdiçam o potencial que a Base das Lajes e o Porto da Praia da vitória encerram. Com os americanos ou sem eles.
(a) Desde logo para a própria parceria transatlântica, na segurança do Atlântico norte, em que Portugal poderia e deveria desempenhar um papel estratégico, perante novas rotas marítimas que deverão surgir com a abertura do Árctico à navegação, o alargamento do canal do Panamá, com o reforço do transporte marítimo de energia, e face aos desafios de segurança que enfrentamos no Médio Oriente e nas costas de África, incluindo terrorismo, pirataria no golfo da Guiné, etc;
(b) Por outro lado, para redireccionar a utilização da Base das Lajes e o porto da Praia da Vitória ao serviço da Política Externa e de Segurança Comum e da Política Comum de Segurança e Defesa da União Europeia;
O interesse e valor estratégicos das Lajes e do porto da Praia da Vitória são óbvios. Que o digam os chineses que têm sido tudo menos tímidos a assentar arraiais em infraestruras estratégicas na Europa, (como o Porto do Pireu) e que almejam controlar rotas transatlânticas de e para Africa, encorajando muitos nos Açores a pensar que eles poderiam ser alternativa aos americanos na Ilha Terceira. Do meu ponto de vista, isso é absolutamente contrário aos interesses estratégicos de Portugal e da Europa, para não falar das obrigações no quadro NATO. Mas para o impedir não podemos continuar a deixar assim, ao desbarato, as potencialidades que temos em solo nacional, com valências civis e militares. Temos de saber aproveitar oportunidades e construir uma política que obedeça a objectivos e interesses estratégicos para o país e que corresponda às nossas responsabilidades europeias e transatlânticas.
(a) Desde logo para a própria parceria transatlântica, na segurança do Atlântico norte, em que Portugal poderia e deveria desempenhar um papel estratégico, perante novas rotas marítimas que deverão surgir com a abertura do Árctico à navegação, o alargamento do canal do Panamá, com o reforço do transporte marítimo de energia, e face aos desafios de segurança que enfrentamos no Médio Oriente e nas costas de África, incluindo terrorismo, pirataria no golfo da Guiné, etc;
(b) Por outro lado, para redireccionar a utilização da Base das Lajes e o porto da Praia da Vitória ao serviço da Política Externa e de Segurança Comum e da Política Comum de Segurança e Defesa da União Europeia;
O interesse e valor estratégicos das Lajes e do porto da Praia da Vitória são óbvios. Que o digam os chineses que têm sido tudo menos tímidos a assentar arraiais em infraestruras estratégicas na Europa, (como o Porto do Pireu) e que almejam controlar rotas transatlânticas de e para Africa, encorajando muitos nos Açores a pensar que eles poderiam ser alternativa aos americanos na Ilha Terceira. Do meu ponto de vista, isso é absolutamente contrário aos interesses estratégicos de Portugal e da Europa, para não falar das obrigações no quadro NATO. Mas para o impedir não podemos continuar a deixar assim, ao desbarato, as potencialidades que temos em solo nacional, com valências civis e militares. Temos de saber aproveitar oportunidades e construir uma política que obedeça a objectivos e interesses estratégicos para o país e que corresponda às nossas responsabilidades europeias e transatlânticas.
Não será com este Governo que o conseguiremos: a forma desastrosa como Passos Coelho e Portas têm conduzido o processo negocial com os americanos passará a "caso de estudo" para a diplomacia e a ciência política. Pela negativa: "como não se defende o interesse nacional!"
(Texto que, em versão encurtada, serviu de base à minha crónica de hoje no Conselho Superior, ANTENA 1)