Por Ana Gomes
Quatro anos passaram sobre a assinatura do memorando de resgate que o país pediu em 2011. A troika já saiu há quase um ano. Temos de concluir que estamos pior. Destruímos riqueza nacional recuando ao nível de há 20 anos atrás; disparou o desemprego que continua insuportável, em 35% para os jovens; disparou a dívida pública que era inferior a 100 e quatro anos depois, está nos 130% do PIB. Hoje temos um em quatro residentes em Portugal a viver em risco de pobreza ou de exclusão social.
Tanto sacrifício, tanta privação, para conseguirmos um reequilibrio temporário do défice, sem nada de realmente estrutural se ter reformado no Estado e se ter alterado na economia nacional: melhores só os juros a que para o rescalonamento do dinheiro pedido emprestado ao exterior pelo Governo, em nosso nome, graças as políticas do sr. Draghi à frente do BCE. Mas afinal a ideia não era que deixássemos de precisar pedir emprestado, ou que reduzíssemos drasticamente o que pedimos?
Como tantos dissemos, só com crescimento sairemos do vermelho - mas para isso precisamos de investimento e aí também regredimos: nem publico, nem privado.
Mas agora, estamos em ano eleitoral, talvez se veja algum investimento público : o governo acelera preparativos para abrir cordões á bolsa com os fundos estruturais europeus. Há dias ouvimos mesmo o mesmo PM afirmar, com supino despudor, que preferia não os gastar a deixá-los malbaratar, como no passado - como se este PM não fosse exactamente o jovem executivo da Tecnoforma que, com o colega Miguel Relvas, sacava fundos europeus para dar formação a centenas de funcionários de dezenas de aeródromos que nunca existiram no país...
Razão de sobra para escrutinarmos não apenas o que Governo fará dos fundos estruturais europeus que já nos estão atribuídos, mas também os projectos de investimento que o Governo entretanto submeteu a Bruxelas candidatando-os a apoios do chamado Plano Juncker.
Até porque o investimento público deveria saber mobilizar e alavancar também investimento privado. Mas, segundo dados recentes, estamos a falar de um governo que deixou saír, durante os anos da troika, pelo menos mais 14,5 milhares de milhões de investimento privado para paraísos fiscais... É um governo de dois pesos e duas medidas: porque impôs uma carga fiscal brutal, sem precedentes, sobre os cidadãos que pagam os seus impostos. Um verdadeiro confisco fiscal determinado pelo gestor da Tecnoforma que se guindou a PM prometendo ...que não ia aumentar impostos.
Não admira, assim, que este seja o mesmo PM que começou por negar veementemente na AR que houvesse uma lista VIP na autoridade tributaria para proteger alguns contribuintes, considerando que isso seria gravíssimo. Pois mal se confirmou que a lista poderia ter existido, a gravidade foi esquecida, dois técnicos demitiram-se, o caso foi dado por encerrado.
Até que a Comissão Nacional de Protecção de Dados veio confirmar que a lista existia mesmo, era conspicuamente restringida a 4 nomes, Presidente da República Cavaco Silva, Primeiro Ministro Passos Coelho, Vice Primeiro Ministro Paulo Portas. E, note-se, o do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, que não se importa de parecer incompetente para manter a ficção de que de nada sabia e continuar impávido no cargo.
A CNPD revelou também que mais de 2000 pessoas de consultoras privadas tem acesso irrestrito aos meus e aos seus dados fiscais, caro ouvinte, que reina a balda na acessibilidade aos dados de qualquer contribuinte excepto os quatro nomes VIP na lista, que a segurança informática dos dados do fisco estava nas mãos de um artolas que apagava emails julgando eliminar os registos para enganar os investigadores da CNPD...
O Primeiro Ministro Pedro Passos Coelho, confrontado com o indesmentivel, faz agora a caramunha e fala em devassa, promete medidas, aguarda mais não sei que inspeções. Lá despedir Ministra e Secretário de Estado que tinham a responsabilidade política directa na matéria, nem pensar: afinal de contas ele precisa dela e Paulo Portas precisa muito dele.
Esta Autoridade Tributária do Secretario Estado Paulo Núncio e da Ministra Maria Luis Albuquerque está feita à medida para proteger os Pedros das Tecnoformas, os Paulos dos submarinos, vistos doirados e outros negócios de ouro. E de todos os que investem no chamado planeamento fiscal para não pagar impostos em Portugal e investir antes nos paraísos fiscais...
(Transcrição da minha crónica de ontem no Conselho Superior da ANTENA 1)