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21 de junho de 2007

Intervenção na plenária do Parlamento Europeu sobre direitos humanos na Etiópia 

por Ana Gomes

I was Head of the EUEOM [EU Election Observation Mission] in Ethiopia in 2005. Many opposition leaders told the EU then that the elections would be another scam by Prime Minister Meles Zenawi to fool the international community and that they would all end up in jail or killed. We, the EU, persuaded them not to boycott the elections, promising to watch and ensure accountability.
The Ethiopians believed us and voted massively and orderly on that 15 May. However, when people protested peacefully against electoral fraud, government forces resorted to brutal repression. In June and November hundreds were killed in massacres and thousands were wounded and imprisoned. Including the opposition leaders who had warned the EU.
They are among the 38 political prisoners found guilty, last June 11, in a farcical trial, in which they were not allowed to effectively present their defence. Sentences are announced for next July, possibly carrying the death penalty. Against some of the most representative, articulate and courageous leaders of Ethiopia: elected MPs, human rights defenders, journalists, activists for development, teachers and other prisoners of conscience. Prof. Mesfin Woldemariam, 77 years old, and the respected founder of the Ethiopian Human Rights Council, is one of them.
The EU is the main aid donor in Ethiopia. I have seen it making the difference there. It can do it again. If the EU Commission, Council and Member States stop turning a blind eye.
They must act immediately, holding the Government of Ethiopia accountable to human rights commitments under the Cotonou Agreement. Holding Prime Minister Meles Zenawi personally responsible and pressing for the release of the prisoners, without delay and unconditionally.
They must follow the recommendations made by the European Parliament in the resolution to be adopted today.
Not to further let down the Ethiopian people. Not to further discredit Europe's commitment towards the development of Africa. Not to betray the most basic European values and principles.

(Estrasburgo, 21 de Junho de 2007)

20 de junho de 2007

Intervenção na plenária do Parlamento Europeu sobre um Tratado Internacional para o Comércio de Armas 

por Ana Gomes

Estes últimos anos não têm dado muitas razões para regozijo aos defensores do controlo de armamento e do desarmamento ancorados em instrumentos legais multilaterais. A decisão da Assembleia Geral da ONU, em Dezembro passado, de abrir oficialmente o processo de elaboração de um Tratado global sobre o Comércio de Armas (ou ATT) é, de facto, uma rara ocasião para festejar.
Sem nos surpreender, entristece o voto solitário dos EUA contra a resolução que deu vida a este processo...
Neste Tratado não se trata apenas de encontrar um denominador jurídico comum para a importação, exportação e transferência de armas, de dar uma resposta global a um comércio completamente globalizado, e de criar critérios uniformes que submetam o comércio de armas aos imperativos dos Direitos Humanos, da estabilidade e do desenvolvimento sustentável.
Trata-se também de mobilizar a opinião pública nos países desenvolvidos contra a opacidade que define os milionários contratos legais de vendas de armas a países aliados.
A decisão escandalosa do governo do Reino Unido de pôr fim à mais recente investigação sobre a venda de armas daquele país à Arábia Saudita, e a corrupção ao mais alto nível que a acompanhou, é um exemplo paradigmático da natureza sui generis deste comércio. Só nesta área um governo europeu se atreve a travar uma investigação séria em nome do 'interesse nacional'! É por causa do tratamento especial que o comércio de armas tem merecido da parte de governos em todo o mundo que é necessário um Tratado especialmente desenhado para o controlar.
E a UE pode e deve liderar esforços nesta área, pugnando para que as lições tiradas da interpretação e aplicação do seu Código de Conduta - em particular no que diz respeito aos critérios de desenvolvimento sustentável e de direitos humanos - sejam aplicadas ao novo Tratado.
Nesse sentido, são bem-vindas as conclusões do último Conselho de Assuntos Gerais que sublinham a importância de aliar esforços com outros Estados e organizações regionais para a elaboração do novo Tratado.
Agora só falta a UE transformar esta boa vontade numa estratégia diplomática em relação ao ATT devidamente ancorada numa Posição Comum do Conselho. Enquanto a razão e os escrúpulos não voltarem a honrar a Casa Branca com a sua presença, a liderança europeia neste domínio é particularmente urgente.

(Estrasburgo, 20 de Junho de 2007)

19 de junho de 2007

Intervenção na plenária do Parlamento Europeu sobre a Cimeira G-8 e os Objectivos do Milénio para o Desenvolvimento 

por Ana Gomes

Genocídio no Darfur, crise no Zimbabwe, guerra na Somália, opressão na Etiópia, farsa eleitoral na Nigéria, fragilidade na RDC, corrupção, pandemias, desertificação, afluxo de armas, competição pelo petróleo e outros recursos naturais - tudo são factores para fomentar mais conflitos em África e fazer crescer o número de desesperados que arriscam as vidas para entrar na Europa ou onde encontrem condições melhores. Por isso, é no mínimo deprimente ver o G-8 limitar-se a repetir promessas de Gleneagles em 2005, entretanto não cumpridas.

A meio do caminho, como bem documenta o relatório de Glenys Kinnock, os OMDs têm ainda de ser interiorizados como prioridade pelos governos europeus e a Comissão. (É com base neles que a UE tem de estruturar as suas políticas de apoio ao desenvolvimento. E não é isso que está a acontecer, como o PE tem verificado ao escrutinar o Instrumento de Cooperação para o Desenvolvimento (DCI) - NÃO LIDO).

Em África, em particular, os OMDs terão de alicerçar qualquer estratégia de segurança e desenvolvimento. E portanto também a estratégia de cooperação conjunta a aprovar na Cimeira EU-África, em Dezembro. Que não pode ser mais uma mera photo-opp: há que sair dela com compromissos faseados para cumprimento dos OMDs por parte das autoridades europeias e africanas. E estratégias que vão além dos governos e além de uma competição míope e sem princípios com a China. Isso implica investir no reforço das instituições democráticas e das sociedades civis nos países africanos. Implica para a UE levar a sério e apoiar aqueles que se batem pelos direitos humanos, pelos direitos das mulheres e pelas liberdades cívicas em África. Implica para a UE e os seus parceiros africanos exigência recíproca no cumprimento dos acordos que já os vinculam, como o de Cotonou. Porque sem Justiça e sem Estado de direito não haverá boa governação e muito menos desenvolvimento sustentável.

(Estrasburgo, 19 de Junho de 2007)

7 de junho de 2007

Acordo das Lajes: avaliar e rever 

por Ana Gomes


O Acordo de Cooperação e Defesa entre Portugal e os EUA devia ter sido revisto em 2000, mas não foi. E ninguém sabe ao certo o que trouxe ou traz a Portugal: recebemos armas (no valor de 173 milhões de euros, mais que o acordado, dizem) e 950 empregos nos Açores (menos que antes). Mas os EUA mantêm acesso privilegiado a um inestimável porta-aviões no meio do Atlântico.
Washington designa-o de “Acordo das Lajes”, pois sem a «65th Air Base Wing» (para nós Base Aérea nº 4) o Acordo não existiria. Para nós o Acordo tem estatuto de Tratado Internacional, obrigando o Estado mal foi ratificado pela AR, em 1995. Mas os EUA distinguem entre Tratados, ratificados pelo Senado e vinculativos, e 'acordos executivos' entre governos. O Senador Joe Biden, Presidente da Comissão de Relações Externas do Senado, confirmou-me que o Acordo "não tem força da lei americana" (em carta de que dei conhecimento ao Governo).
O Acordo das Lajes é, pois, apenas um “acordo executivo”: Washington só cumpre o que lhe convém. Não respeita, por exemplo, o previsto no componente Acordo Laboral sobre aumentos salariais. Isto apesar do Acordo estipular os direitos e deveres dos portugueses empregados na Base das Lajes, que não usufruem assim da lei nacional. O Acordo proíbe até a filiação sindical e, mais escandaloso ainda, estabelece um complexo – e inconstitucional - processo para impedir o recurso aos tribunais portugueses na resolução de disputas laborais.
O arbítrio instila precariedade e medo entre os trabalhadores da Base, como se viu recentemente a propósito de interrogatórios conduzidos pelo OSI (Office of Special Investigations da Força Aérea americana), entendidos como meio de intimidação (para quem se dispusesse a falar sobre problemas laborais ou transferências de prisioneiros....).
No Acordo de 1995 os Açores nada ganharam, além dos empregos na Base. Armando Mendes no artigo «A Acta escondida do Acordo das Lajes” (publicado no "Diário Insular" em 25.2.2007) nota que a promessa dos EUA de acabar com a praga do escaravelho japonês (introduzida pelos próprios americanos) não foi cumprida; a promoção do fornecimento de bens e serviços açorianos ao contingente americano na Terceira e da exportação de produtos açorianos para os EUA está por fazer; a dragagem de portos e o reboque de barcos foi levada a cabo apesar dos EUA, ao contrário do especificado no Acordo. Quanto à acção da FLAD, financiada por transferências do anterior Acordo (1983), são parcos os benefícios contabilizados pelos Açores; só recentemente um açoriano, Mário Mesquita, penetrou na direcção da FLAD.
É inaceitável a passividade face ao desiquilíbrio, com prejuízo nosso. Precisamos de rever o Acordo e de saber defender os nossos interesses na renegociação. Importa ter o Governo Regional dos Açores à mesa. E obter contrapartidas direccionadas também para desenvolver o potencial científico, económico e outro dos Açores, no quadro das estratégias portuguesa e europeia para o Mar. Importa estudar os acordos que os EUA têm com Espanha, Itália, Turquia, etc. E interiorizar que os desafios geo-estratégicos que hoje se enfrentam, incluindo a actuação do terrorismo em África, tornam cada dia mais relevante - para os EUA e para a UE - o gigantesco porta-aviões das Lajes; como confirmam, de resto, vultuosos investimentos que Washington tem em curso na Base. Renegociar implica fazer lobby no Congresso, onde sopram ventos que deveríamos aproveitar para exigir que o Acordo seja ratificado pelo Senado. De outro modo, os "princípios da reciprocidade" evocados na Acta Final do Acordo continuarão a não passar de piada de mau gosto.
Não se trata de nos queixarmos dos EUA, que cuidam de defender os seus interesses. Cabe a Portugal defender os seus. E para isso é preciso que os nossos governantes, diplomatas e militares deixem de confundir lealdade para com o aliado americano com subserviência e falta de ambição.

(artigo publicado no EXPRESSO, edição de 2.6.07)

5 de junho de 2007

Defesa anti-míssil: Congresso EUA faz-se ouvir 

por Ana Gomes

A imprensa portuguesa salientou que a Assembleia Parlamentar da NATO, que reuniu no final da passada semana na Madeira, discutiu o projecto americano de colocação de um radar na República Checa e mísseis interceptores na Polónia, projecto que está a desencadear fortes reacções, na Rússia em particular. A maioria dos jornais, porém, limitou-se a reproduzir, com intermediação de José Lello e LUSA, argumentos de Daniel Fata, o representante da Administração Bush que veio defender o plano. Mostrou-se assim indiferente ao que foi dito de novo e muito relevante na Madeira: que a Câmara dos Representantes há duas semanas cortou os fundos (mais de 760 milhões de dólares) que deveriam pagar a instalação desses equipamentos na Polónia e na República Checa; e que, se a Administração queria prosseguir o plano, que fizesse o "trabalho de casa", articulando-se antes devidamente com os aliados e parceiros da NATO, Rússia incluída. Disse-o uma voz autorizada, que o Sr. Fata não se atreveu a contestar: a da Congressista Ellen Tauscher (Democrata, da Califórnia), que preside à Subcomissão de Forças Estratégicas.
Na Europa a importância do tema exige mais do que indiferença ou deferência: a proliferação de armas de destruição maciça constitui um dos maiores perigos para a Humanidade, frisa-o a Estratégia Europeia de Segurança. A tecnologia míssil, em particular, ainda há poucas décadas só nas mãos de algumas potências, hoje espalha-se como um cancro.
É em nome da ameaça balística e nuclear iraniana (indisputável, embora haja divergências sobre a melhor forma de lidar com ela) que os EUA querem colocar parte do seu sistema de defesa anti-míssil no continente europeu. Mas, como se confirmou no debate na Madeira, não passa despercebido aos aliados europeus o facto da Administração Bush ter contornado NATO e a UE, escolhendo como interlocutores "bilaterais" Varsóvia e Praga: dividir para reinar...
O projecto sofre de três problemas de fundo, como o debate na Madeira expôs: a questão técnica; as consequências políticas (proliferação incluida); e a credibilidade da fonte.
Quanto à questão técnica, sabe-se muito pouco. O Governo de Bush diz querer ter a secção europeia do sistema a funcionar em 2012, prevendo gastar €2,6 mil milhões. Está disposto a enterrar esta soma astronómica num projecto cuja viabilidade técnica é posta em causa pelo Government Accountabilty Office, instituição americana comparável ao Tribunal de Contas português, que explicou em Março "ainda não é possível avaliar a viabilidade deste projecto porque não houve testes suficientes para confirmar empiricamente os modelos e simulações que lhe subjazem"!
É em nome de um projecto que Ellen Tauscher considera "de alto risco e imaturo", que a Administração Bush quer arriscar uma nova corrida aos armamentos, nomeadamente com a Rússia. Claro que o poder dissuasor garantido pelo enorme arsenal balístico de Moscovo não é posto em causa pelo segmento europeu do sistema americano; mas também é verdade que este sistema de defesa anti-míssil a médio prazo desvalorizará os arsenais das outras grandes potências. Ora, como disse Sergei Ivanov, vice-Primeiro Ministro russo "para cada escudo se encontra uma espada mais eficaz": mesmo sendo fiável, o sistema só funciona até ao dia (a chegar sempre mais depressa do que se pensa) em que alguém invente um míssil maior, mais rápido ou menos visível no radar...
E, por fim, surge a questão da credibilidade. Em quem acreditar: nos cépticos no Congresso americano que já começaram a cortar fundos ao projecto e naqueles, na Europa, que temem que ele divida a UE, menorize a NATO e diminua probabilidades de uma verdadeira Política Europeia e de Segurança Comum? ou numa Administração Bush de credibilidade nula, entusiasta de soluções militares "na hora", desesperada por deixar qualquer legado de segurança aos EUA - perante um Iraque fora de controlo, um Irão galvanizado e uma Coreia do Norte em roda livre ?

(Publicado no COURRIER INTERNACIONAL, 1.6.2007)

Defesa anti-míssil: Congresso EUA faz-se ouvir 

A imprensa portuguesa salientou que a Assembleia Parlamentar da NATO, que reuniu no final da passada semana na Madeira, discutiu o projecto americano de colocação de um radar na República Checa e mísseis interceptores na Polónia, projecto que está a desencadear fortes reacções, na Rússia em particular. A maioria dos jornais, porém, limitou-se a reproduzir, com intermediação de José Lello e LUSA, argumentos de Daniel Fata, o representante da Administração Bush que veio defender o plano. Mostrou-se assim indiferente ao que foi dito de novo e muito relevante na Madeira: que a Câmara dos Representantes há duas semanas cortou os fundos (mais de 760 milhões de dólares) que deveriam pagar a instalação desses equipamentos na Polónia e na República Checa; e que, se a Administração queria prosseguir o plano, que fizesse o "trabalho de casa", articulando-se antes devidamente com os aliados e parceiros da NATO, Rússia incluída. Disse-o uma voz autorizada, que o Sr. Fata não se atreveu a contestar: a da Congressista Ellen Tauscher (Democrata, da Califórnia), que preside à Subcomissão de Forças Estratégicas.
Na Europa a importância do tema exige mais do que indiferença ou deferência: a proliferação de armas de destruição maciça constitui um dos maiores perigos para a Humanidade, frisa-o a Estratégia Europeia de Segurança. A tecnologia míssil, em particular, ainda há poucas décadas só nas mãos de algumas potências, hoje espalha-se como um cancro.
É em nome da ameaça balística e nuclear iraniana (indisputável, embora haja divergências sobre a melhor forma de lidar com ela) que os EUA querem colocar parte do seu sistema de defesa anti-míssil no continente europeu. Mas, como se confirmou no debate na Madeira, não passa despercebido aos aliados europeus o facto da Administração Bush ter contornado NATO e a UE, escolhendo como interlocutores "bilaterais" Varsóvia e Praga: dividir para reinar...
O projecto sofre de três problemas de fundo, como o debate na Madeira expôs: a questão técnica; as consequências políticas (proliferação incluida); e a credibilidade da fonte.
Quanto à questão técnica, sabe-se muito pouco. O Governo de Bush diz querer ter a secção europeia do sistema a funcionar em 2012, prevendo gastar €2,6 mil milhões. Está disposto a enterrar esta soma astronómica num projecto cuja viabilidade técnica é posta em causa pelo Government Accountabilty Office, instituição americana comparável ao Tribunal de Contas português, que explicou em Março "ainda não é possível avaliar a viabilidade deste projecto porque não houve testes suficientes para confirmar empiricamente os modelos e simulações que lhe subjazem"!
É em nome de um projecto que Ellen Tauscher considera "de alto risco e imaturo", que a Administração Bush quer arriscar uma nova corrida aos armamentos, nomeadamente com a Rússia. Claro que o poder dissuasor garantido pelo enorme arsenal balístico de Moscovo não é posto em causa pelo segmento europeu do sistema americano; mas também é verdade que este sistema de defesa anti-míssil a médio prazo desvalorizará os arsenais das outras grandes potências. Ora, como disse Sergei Ivanov, vice-Primeiro Ministro russo "para cada escudo se encontra uma espada mais eficaz": mesmo sendo fiável, o sistema só funciona até ao dia (a chegar sempre mais depressa do que se pensa) em que alguém invente um míssil maior, mais rápido ou menos visível no radar...
E, por fim, surge a questão da credibilidade. Em quem acreditar: nos cépticos no Congresso americano que já começaram a cortar fundos ao projecto e naqueles, na Europa, que temem que ele divida a UE, menorize a NATO e diminua probabilidades de uma verdadeira Política Europeia e de Segurança Comum? ou numa Administração Bush de credibilidade nula, entusiasta de soluções militares "na hora", desesperada por deixar qualquer legado de segurança aos EUA - perante um Iraque fora de controlo, um Irão galvanizado e uma Coreia do Norte em roda livre ?

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